Em 7 de maio de
2011, publicamos
aqui no VÍNCULO
(edição 978), dentro
da
“Série BNDES”1,
o artigo
“Ensaios
sobre a loucura...
econômica – ou
Saudades do carioca
Stanislaw Ponte
Preta”,
no qual mostrávamos
que, a despeito de
uma conjuntura
bastante complexa
que indicava nítidos
sinais de
desagregação da
situação
político-econômica
mundial, o
noticiário
especializado
assegurava para
2011/12 um ambiente
de crescimento
mundial e de 4,5% a
5,0% para o PIB
brasileiro.
No texto,
especulamos que
diante daquela
conjuntura difícil o
crescimento de 7,5%,
de 2010, poderia se
reduzir para 3,5%,
nível desejado por
dez entre dez
analistas defensores
do status quo.
Segundo eles, tal
ritmo garantiria a
sustentabilidade no
médio prazo e a paz
dos cemitérios. De
fato, com um quadro
mundial que já
mostrava alguns
sintomas de
desajuste
político-econômico,
nossas autoridades,
preocupadas com o
nível inflacionário
e com um possível
nível de aquecimento
interno, elevavam a
taxa Selic e
anunciavam medidas
macroprudenciais
para esfriar a
demanda interna.
Mas a nossa
preocupação
recorrente era
outra: a elevação
dos juros com a
consequente
valorização do real
e o que isso
acarretaria para a
nossa indústria, o
déficit de
transações correntes
e a redução do nível
de crescimento.
Ocorreu que, no
último dia 6 de
março, o IBGE
anunciou que, em
2011, o PIB
apresentou
crescimento de
2,7%.
Sim, o desempenho da
economia ficou
abaixo de nossa
estimativa e também
da média mundial, de
3,8%. Um ano após
crescermos 7,5%,
alcançamos apenas
2,7%, ou seja,
considerando que o
ano seguinte a um
forte crescimento
ainda carrega uma
força inercial,
significa que o PIB
sofreu um forte
desaquecimento.
De fato, pela ótica
da produção
(oferta), vemos que
os setores
agropecuário e
extrativo mineral (commodities)
cresceram em
conjunto 3,7%, a
indústria, setor
mais nobre para a
criação de valor
adicionado (produto
real), cresceu
apenas 1,6%, sendo
que a indústria de
transformação tão
somente 0,1%.
Pela ótica da
demanda, vemos que o
investimento
elevou-se em 4,7%,
enquanto o consumo
das famílias em 4,1%.
Chama atenção o
crescimento das
importações, de
9,7%, o que, em face
da contribuição nula
da indústria de
transformação, nos
faz deduzir que
parte do consumo
familiar e parte
significativa dos
insumos industriais
e dos investimentos
vieram do exterior,
tudo graças à
valorização do real!
Preocupa-nos,
também, o
crescimento do
déficit em
transações correntes
– nosso histórico
“calcanhar de
Aquiles” e razão de
todas as crises
econômicas – que, em
sua trajetória de
crescimento, ao
atingir o patamar de
US$ 55 bilhões,
caminha para atingir
3% do PIB, ponto em
que começa a
enfraquecer nossos
fundamentos.
Em Goldman Sachs
confiamos...!2
Durante o segundo
semestre de 2011,
diante do
recrudescimento da
crise na Zona do
Euro, o mundo
acompanhou
apreensivo a falta
de governança dos
líderes europeus.
Apesar de diversas
reuniões, não se
chegava a qualquer
consenso. Em vez da
esperada
coordenação, vimos a
discórdia.
A Zona do Euro vista
como um conjunto, ou
uma federação,
representa o segundo
maior PIB do mundo.
Somado com o PIB dos
Estados Unidos,
representa quase
metade do PIB
mundial, daí a
preocupação com o
destino daquele
bloco econômico que,
como federação, é um
conjunto
extremamente sólido
e os membros mais
ricos têm condições
de bancar facilmente
os menores com
dificuldades
estruturais
(refinanciando
dívidas, efetuando
programas de compras
de seus insumos,
enfim, mantendo a
atividade econômica
e o emprego). A
propósito, não é a
hora para a
implantação do
instrumento EUI
(Empregador de
Última Instância),
de Randall Wray,
exposto no artigo
“BNDES
sempre!”,
também disponível na
“Série BNDES”?
Entretanto, a
solução veio pelo
mercado. Por um
lado, rígidos
programas de ajustes
fiscais aos países,
com corte de
empregos e salários.
Por outro,
afrouxamento da
liquidez e forte
ajuda às
instituições
financeiras a juros
ridículos pelo Banco
Central Europeu (BCE),
numa verdadeira
política “à La Hood
Robin”: salvaram os
bancos às custas do
sacrifício social!
Quando ansiávamos
por coordenação e
governança, vimos
três novos líderes
chegarem à cena:
Mario Draghi ao BCE,
substituindo J.
Claude Trichet;
Evangelos Venizelos
ao Ministério de
Finanças da Grécia,
em lugar do
ex-primeiro-ministro
Papandreou; e Mario
Monti ao posto de
Primeiro-Ministro da
Itália, substituindo
o demitido
Berlusconi.
Coincidentemente,
todos ex-Goldman
Sachs. O primeiro
abriu as torneiras
do BCE aos bancos
europeus e os outros
dois implantaram
políticas de fortes
restrições fiscais
em seus respectivos
orçamentos,
promovendo cortes
salariais e
demissões de
funcionários. Até
quando os
esclarecidos
trabalhadores
europeus aceitarão
esse remédio
amargo?
Tsunami
O binômio alta
liquidez e cortes
fiscais se alastrou
por quase todos os
países do euro.
Logicamente, a
tsunami de liquidez
transbordou o
continente europeu
em busca de boas
barganhas pelo
mundo. Essa nova
liquidez se junta
com a advinda dos
EUA, a única
política possível
num país em meio a
uma disputa
eleitoral e lento
crescimento. Toda
essa liquidez forma
uma grande onda à
procura de
aplicação. O Brasil
com seus juros
acolhedores recebeu
parte dessa onda,
valorizando o real e
finalmente
“acordando” as
nossas autoridades
públicas.
Sinuca de bico
Na
“Série BNDES”,
desde o primeiro
artigo,
“BNDES
sempre!”,
de julho de 2008,
vimos batendo em
duas questões
estruturais: a
redução dos nossos
juros
estratosféricos, que
valorizam o real,
provocando um grave
processo de
desindustrialização,
e a necessidade de
um plano estratégico
para administrarmos
nossas riquezas
recém-descobertas e
efetivarmos o
resgate de nosso
passivo social (“BNDESOCIAL:
o resgate do passivo
social”).
Estamos alertando
para o agravamento
da situação e
sugerindo
instrumentos
facilitadores para o
financiamento do
plano estratégico
como foi o caso do
arranjo
“BNDES/TESOURO”, exposto em artigo de agosto de 2008 – instrumento
que quando veio a
público em janeiro
de 2009 (“Aliança
BNDES-Tesouro:
premonição ou
lógica?”) foi imediatamente rejeitado por dez entre dez analistas defensores do
status quo, já
que, para eles,
juros altos eram
necessários para
combater a inflação
e era discutível a
tese de que os juros
eram a causa da
valorização cambial!
Agora, com o PIB
2011 revelado, a
desindustrialização
aberta e a tsunami
querendo valorizar o
real, as luzes
vermelhas acenderam
e nossas autoridades
correm para fechar
os furos da
mangueira! Aumentam
o Imposto sobre
Operações
Financeiras (IOF)
para os
financiamentos à
exportação, reduzem
os juros em 0,75% e
acenam com redução
de impostos.
Infelizmente, todas
medidas paliativas,
já que estão na
encruzilhada: ou
continuam seguindo o
mercado mantendo os
juros ainda
elevados, com o
risco da valorização
do real, da
desindustrialização
acelerada e do
desaquecimento não
planejado, ou partem
para definir um
plano para o país,
um plano pactuado
tendo em vista a
cidadania ampliada.
Infelizmente, o
momento não permite
mais meias medidas.
É hora de definir o
caminho. Em
“BNDES-TESOURO
e o PAD”,
de novembro de 2011,
já antecipávamos
sugestões, que,
diante da
conjuntura,
acreditamos ser de
alguma valia.
Em tempo: como más
notícias não vêm
sozinhas,
acrescentem ao que
foi exposto um
possível
desaquecimento
chinês!