Opinião

Edição nº1359 – quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Ataque ao BNDES é perturbador e surpreendente

Brasil talvez seja o mercado emergente para o qual um banco de desenvolvimento nacional seja mais importante

Joseph E. Stiglitz (*)

Prêmio Nobel de Economia em 2001. Tradução de Paulo Migliacc

Em todo o mundo, houve grande mudança de perspectiva sobre o valor e a importância dos bancos de desenvolvimento. E por bons motivos: eles desempenharam papel central em promover o crescimento e o investimento e em ajudar a estabilizar a economia.

Ajudam a sociedade a resolver grandes questões sociais usualmente desconsideradas pelo setor privado, como a desigualdade e o aquecimento global. Servem como intermediário crucial entre o investidor de longo prazo e as necessidades de investimento em longo prazo, de uma forma que os mercados financeiros privados, tipicamente concentrados no curto prazo, não fazem.

É por isso que a Europa vem expandindo seu banco de desenvolvimento, o Banco de Investimento Europeu, o maior do planeta. É por isso que alguns estados dos EUA criaram novos bancos de desenvolvimento. É por isso que o mais importante grupo de países de mercado emergente, o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), criou o Novo Banco de Desenvolvimento, que vem florescendo e fazendo uma contribuição importante ao desenvolvimento.

Pesquisas recentes corroboram esses insights.

Os empréstimos de bancos de desenvolvimento se traduzem em investimento mais produtivo – diferentemente de muitos dos empréstimos do setor privado, destinados ao consumo e à habitação.

Ajudam a elevar a produtividade das empresas que recebem os fundos, especialmente as PMEs (pequenas e médias empresas), que muitas vezes encontram restrições no crédito que são capazes de obter do setor privado.

É por isso que é tão surpreendente, e tão perturbador, ver o recente ataque a, e os esforços para restringir, um dos maiores bancos de desenvolvimento do planeta, o BNDES.

Isso é especialmente perturbador porque o Brasil talvez seja o emergente para o qual um banco de desenvolvimento nacional seja mais importante. Seu setor financeiro privado – que historicamente cobra juros entre os mais altos do planeta – faz um dos piores trabalhos em termos de cumprir o papel social de oferecer financiamento a empresas, especialmente PMEs.

Sejamos claros: nenhum banco é perfeito.

É sempre fácil ver em retrospecto se um projeto era bom. O que os economistas definem como "questões de agência" – casos em que os empregados de uma organização, ao seguir seus próprios interesses, às vezes fracassam em defender os melhores interesses daqueles a quem deveriam servir – e o que as pessoas chamam de "corrupção" acontece tanto em instituições públicas quanto privadas.

O nível de "corrupção" nas instituições financeiras privadas e com fins lucrativos dos EUA excede por diversas ordens de magnitude a corrupção vista em cooperativas ou em instituições financeiras públicas; e os EUA e o mundo pagaram um preço elevado por seus delitos.

Quando falhas em instituições se tornam aparentes, a tarefa é reformar a instituição, não aboli-la.

O Fed (Federal Reserve), o banco central dos EUA, fracassou em seu papel regulatório nos anos que antecederam a Grande Recessão; foi excessivamente influenciado por banqueiros privados que pediam confiança e defendiam a autorregulamentação.

A resposta não estava em abolir o Fed. A resposta estava em tornar mais claras suas responsabilidades regulatórias, reconhecendo os problemas inerentes causados pelos bancos privados.

O crescimento do Brasil vem sendo volátil. O país teve mais de uma década de expansão forte antes que os preços das commodities caíssem e a economia entrasse em recessão.

O BNDES merece parte do crédito pelo crescimento notável do período e por ajudar a reduzir a dependência do país da exportação de recursos naturais. Mas não pode, e não deveria, ser culpado pela recessão.

Se o objetivo é restaurar o crescimento sustentável e de longo prazo, e especialmente se essa expansão deve ser equitativa, o BNDES e outros bancos estatais de desenvolvimento precisam ser encorajados e expandidos, não reprimidos.

O grande insight sobre o desenvolvimento nos últimos 35 anos, durante os quais alguns poucos países conseguiram registrar crescimento notável, é que as instituições importam, e entre elas as mais importantes são os bancos de desenvolvimento.

O Brasil deveria respeitar essa lição.

(*) Joseph E. Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia em 2001. Tradução de Paulo Migliacci.

(**) Publicado em 21/08/2019 na Folha de S. Paulo

 

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Seminário sobre imprensa, democracia e história

A OAB/RJ, com o apoio da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), está realizando o seminário “Imprensa, democracia e história – da abertura política ao governo Bolsonaro”. O tema do próximo dia 28 será “A liberdade de imprensa está em risco?”, com o jornalista Jânio de Freitas, colunista da Folha de S. Paulo.

Em 4 de setembro, último dia do seminário, haverá debate sobre “Novas vozes na imprensa – ação e reação”, com a jornalista Flávia Oliveira, colunista de O Globo e comentarista de economia na GloboNews e CBN Rio, e Carol Oms, jornalista de economia e diretora-executiva da Revista AzMina.

As palestras são realizadas às 17h, no Plenário Evandro Lins e Silva, localizado na Av. Marechal Câmara 150, 4º andar.