Homenagem a Carlos Lessa

Brasil perde um grande Brasileiro

A morte do professor Carlos Lessa pegou todos nós de surpresa. 

Lessa morreu na manhã de sexta-feira (5), aos 83 anos, no Hospital Copa Star, onde estava internado por causa de uma pneumonia em decorrência do novo coronavírus. 

O falecimento do mestre foi informado pelo filho Rodrigo Lessa nas redes sociais: “Meu amado pai foi hoje às 5 horas da manhã descansar. A tristeza é enorme. Seu último ano de vida foi de muito sofrimento e provação. O legado que ele deixou não foi pequeno. Foi um exemplo de amor incondicional pelo Brasil,  coerência e honestidade intelectual, espírito público, um professor como poucos e uma alma generosa que sempre ajudou a todos que podia quando estava a seu alcance, um grande amigo. Que descanse em paz.” 

Na própria sexta-feira, a AFBNDES, na figura do seu presidente, publicou uma nota de pesar, que reproduzimos abaixo. Entre seus últimos trabalhos intelectuais, diz a nota, Lessa deixou um profícuo debate sobre a questão da falta de autoestima do brasileiro. “Vamos precisar ler e reler Lessa para conseguirmos manter nossa autoestima depois do mergulho recente que demos no obscurantismo, nas trevas”, conclui o texto.  

Em homenagem a Lessa, VÍNCULO também publica, nesse espaço especial, notas comovidas do Instituto de Economia da UFRJ, da Reitoria da UFRJ e do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro (os links estão ao lado). 

Trazemos ainda depoimentos de funcionários e aposentados do BNDES e de um colega, professor da UFFRJ, com belas mensagens sobre o “brasileiro apaixonado”, o “sedutor”, o professor que “ousou pensar o futuro”, o “gênio da brasilidade”, o “patriota”, o “defensor dos interesses do povo e da cultura brasileira”, o “mestre inesquecível”. Esses depoimentos foram divididos em duas partes e também podem ser acessados nesta página.        

Aqui também será possível encontrar um artigo de Lessa sobre o BNDES publicado em agosto de 2005 no jornal Valor Econômico, quase um ano depois de o professor deixar a Presidência do Banco. Esse texto foi republicado no VÍNCULO em abril de 2017, quando estávamos na luta contra a extinção da TJLP. “Atrofiar, ‘privatizar’ ou, se possível, fechar o BNDES” – pelo título, é fácil entender o porquê da republicação.   

Também republicamos matéria do VÍNCULO de fevereiro de 2003 – primeira edição do jornal da AFBNDES após a posse de Lessa na Presidência do BNDES, no início do governo Lula. Lá encontramos opiniões do economista e homem público em momentos diversos: em 1982, ainda durante a ditadura militar, em palestra organizada pela Associação; em 1985, quando assumiu a diretoria responsável pelo Finsocial, no início da Nova República; e em 2003, quando chegava ao comando do Banco cercado de enormes expectativas. Em todas as falas, o compromisso com a industrialização e o desenvolvimento do país.      

E para abrilhantar esta homenagem, o canal da AFBNDES no YouTube traz vídeo com mensagens sobre o legado de Carlos Lessa reunindo Luciano Coutinho, Paulo Rabello de Castro, Joaquim Levy (ex-presidentes do BNDES), Darc Costa (vice-presidente do Banco na gestão de Lessa) e Arthur Koblitz, presidente da AFBNDES (link ao lado).   

Não é fácil perder um homem como Carlos Lessa, principalmente nesse momento em que experimentamos crises extremas e simultâneas no Brasil: econômica, sanitária, social, política e moral.  

Um dos últimos desenvolvimentistas históricos, como diz o Instituto de Economia da UFRJ, Lessa não desaparecerá jamais. Seu legado sempre estará entre nós.


 

NOTA DE PESAR

AFBNDES lamenta a morte do professor Carlos Lessa

Carlos Lessa foi presidente do BNDES por pouco tempo, de janeiro de 2003 a novembro de 2004. Foi o primeiro presidente do Banco do governo Lula. Como presidente do BNDES, foi controverso. Teve sérias dificuldades com o restante da equipe econômica, formada por Palocci na Fazenda, Henrique Meirelles no Banco Central e Furlan no Ministério do Desenvolvimento. Internamente, é criticado – mesmo por admiradores – como gestor. Resolveu bater de frente com a burocracia que comandou o Banco no período FHC, muitos argumentam que de forma injusta, nem sempre democrática. Mas entre seus acertos – que grandes acertos – estão, por exemplo, o lançamento das bases de um dos programas que mais orgulham os empregados do BNDES, a atuação na área de saúde, nas cadeias produtivas do setor de fármacos.

No BNDES ainda, teve sua primeira passagem nos anos 1980 (1985-89), sendo responsável pela gestão e execução das primeiras operações com recursos do Finsocial. O “S” sendo posto em prática e criando uma expertise setorial não existente no país até então.

Enquanto presidente, também foram suas a decisão de manter a maioria acionária da Vale nas mãos de nacionais – o que explica parte dos grandes problemas com o resto do governo – e o incentivo que deu para que o Banco se envolvesse nos esforços de integração da América do Sul. Entre os empregados é lembrado muito o “curso de formação” que organizou na Casa. O Banco ideal de Lessa estaria voltado para grandes projetos que poderiam mudar o país; a burocracia do BNDES deveria estar engajada nesses projetos.

Um orador excepcional, Lessa foi professor da UFRJ durante um período em que formou uma legião de alunos e admiradores. Ele foi autor de um dos maiores clássicos da economia política brasileira, “15 anos de política econômica”. Uma interpretação e análise do funcionamento na prática do Plano de Metas do governo Juscelino Kubitschek. O Plano foi responsável pelo primeiro verdadeiro arranque da economia brasileira na modernidade industrial. Sobre o papel do BNDES, escreveu Lessa: “Preencheu, assim, o BNDE, de forma não declarada, a função de centro de análise de programas governamentais, constituindo-se, por mais esta razão, na peça básica da filosofia do Plano de Metas”.

Ele era acima de tudo um apaixonado pelo Rio de Janeiro, pelo Brasil e pela América Latina. Organizador da “Enciclopédia da Brasilidade”, um patriota – a vida de Lessa ensina – não pode ser uma fixação vazia pela bandeira nacional ou pela camisa da seleção brasileira. Muito menos por um respeito temeroso ou acrítico à história desse país. Em suma, não é como ser fã de um time de futebol. Patriotismo é algo mais profundo, que exige uma busca por conhecimento sobre a história e a cultura, popular e erudita, de um país. Exige também generosidade; ser patriota no Brasil é sonhar e lutar por um futuro coletivo melhor. Não é apenas sonhar com um país mais justo, mas com uma economia mais produtiva, mais eficiente.

Carlos Lessa foi de uma geração que testemunhou, soube reconhecer e se esforçou para entender o arranque do desenvolvimento brasileiro nos anos de 1950. Sofreu com o retrocesso da ditadura e nutria, como muitos, esperança de que com a superação do regime militar retomaríamos o rumo do desenvolvimento, com inclusão social, ou, como ele preferia dizer, com “cidadania” (com significado mais amplo).

Entre seus últimos trabalhos intelectuais, um profícuo debate sobre a questão da falta de autoestima do brasileiro. Vamos precisar ler e reler Lessa para conseguirmos manter nossa autoestima depois do mergulho recente que demos no obscurantismo, nas trevas.

Arthur Koblitz, presidente da Associação dos Funcionários do BNDES – AFBNDES.

     

O canal da AFBNDES no YouTube traz vídeo com mensagens sobre o legado de Carlos Lessa

Depoimentos de Paulo Faveret, José Eduardo Pessoa de Andrade, Thiago Mitidieri e Antônio Saraiva

Depoimentos de Pedro Palmeira, Leonardo Pamplona, Pedro Quaresma, Hélio Pires da Silveira e Cid Botelho

Atrofiar, ‘privatizar’ ou, se possível, fechar o BNDES, por Carlos Lessa

Matéria publicada no VÍNCULO 614, de 5 de fevereiro de 2003, logo após a posse de Carlos Lessa na Presidência do BNDES

O Brasil perde um grande Brasileiro, com B maiúsculo Reitoria da UFRJ

Nota de Pesar - Falecimento do Prof. Carlos Lessa Instituto de Economia da UFRJ

Carlos Lessa era grande demais –Corecon-RJ