Uma Noite no Museu: A Revolução Cultural da Austeridade

Paulo Moreira Franco

Economista do BNDES

"O que fazer? Tudo ruiu
Começou tudo a carcomer
Gritei, ninguém ouviu
E olha que eu ainda fiz psiu!
(Nostradamus)

Ia escrever um artigo sobre uma interessante palestra de lançamento dos livros de Laura Carvalho ("Valsa brasileira; Do boom ao caos econômico") e de Esther Dweck (e outros, "Economia para Poucos: Impactos Sociais da Austeridade e Alternativas para o Brasil"), sendo que o livro da Esther foi discutido cá nesta terça... quando saiu o artigo do Arthur, com sua defesa do "movimento". E comecei a escrever algo a respeito, e aí... bem, e aí veio a noite de sexta, e veio o domingo.

Não tem o que se falar. A ciência, a história, tudo ardendo na fogueira do descaso.

Isso não é problema pra quem só vê geração de valor. Isto não é problema pra quem pega um voo para Orlando ou para Toscana na primeira oportunidade. Ciência, História, seus objetos de estudo, seu ensino, isto não tem importância ante a uma economia bem conduzida, que atenda aos cidadãos insatisfeitos com o montante de impostos pagos e a qualidade dos serviços públicos recebidos, no poético português dos empreendedores da soma-zero dos mercados financeiros.

Isto não é problema pra quem, além do dinheiro, vê um conjunto de valores despossuídos de história e ciência como sua inspiração, sua fundação moral, sua construção de persuasão sobre aqueles a quem foi negado o conhecimento de história e ciência. Isto não é problema pra quem, no seu entendimento mesquinho, literal, do mundo, entendimento construído em cima do imediato, do oportunismo, da negação de que o Mundo existe – e se manifesta, não só em opiniões, mas em Comissões.

Os custos de uma política cultural em que se criam novos espaços a serem terceirizados – seja por isenções fiscais, seja com pagamentos diretos do Estado – à gestão de organizações como a Fundação Roberto Marinho, espaços de duvidosa qualidade de conteúdo, mas novinhos e bonitinhos, esses custos estão à mostra. E, infelizmente, não há rever-são que possa ser feita. Os atos de estupidez econômica do governo golpista, os atos de destruição institucional dos savonarolas de Curitiba e adjacências, tudo isso causa traumas, tudo isso causou perdas, quem sabe mesmo perdas de vidas. Alguém há de calcular essas perdas, alguém irá calcular essas perdas.

Mas não há retorno para o que pegou fogo. Retorno houve para aqueles que pregaram e praticaram a destruição do Estado. Mas os fósseis, os documentos, os objetos que incorporavam a história etnográfica...

A política de austeridade que começou com Joaquim Levy precisa ser inter-rompida. Seus apologistas precisam ser responsabilizados, tornados accountable pelo estrago que causaram. Os condutores dessa destruição, tanto antes, quanto no governo golpista, entendidos como os oportunistas que são.

Os eleitorados, não só lá fora como aqui, sinalizam um não às políticas neoliberais, um desejo de retomar o controle de uma pauta pública que lhes foi tomada por um conjunto de tecnocratas ambivalentes quanto às suas apostas existenciais, seja quanto ao público-privado, seja quanto à sua própria localização geográfica no planeta. 2018 está sendo o ano em que, na Roma do credo neoliberal, o Reino Unido de Blair e dos Tories, o modelo de terceirização do Estado está desmoronando. A falência da Carillion é o exemplo maior, mas há outros. As eleições na Suécia devem ser o próximo exemplo desta revolta de um mundo local ao até aqui "bem-sucedido" modelo de condução do mundo que é a globalização sob a ideologia neoliberal.

Os moralismos, o hipócrita e ignorante das políticas de austeridade, o sadomasoquismo das políticas de compliance emanadas de uma burocracia que se preocupa cada vez menos com os destinos da nação e da vida cotidiana das pessoas – e cada vez mais com suas fantasias de poder –, ambos têm que acabar.

Não me preocupa o Banco no momento, não me preocupa o "movimento" – que nada mais é que o desespero ante a uma mudança em que os oportunistas do que ainda é "os de sempre" provavelmente serão substituídos por novos (oportunistas). Ninguém é inocente, o que não quer dizer que otários não existam.

E enquanto isso o mundo gira, a Lusitana roda, o Departamento de Cultura do BNDES acabou, e se o movimento é bem moderno, não disse nada do modelo ser eterno. O que não acaba em samba, acaba em tragédia. Não é só momento de luto, mas de luta. Com as devidas rimas, ao estado de espírito e aos filhos.

 

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