Populismo – o termo da moda
 

Celso Evaristo
Empregado do BNDES
 
O populismo é um conceito polissê-mico e, como tal, sua definição varia ao sabor das tendências político-ideológicas. Grosso modo, caracteriza-se pela forma de exercício do poder na qual existe vínculo emocional direto entre as massas e uma liderança carismática, com ou sem a intermediação de partidos e corporações. Ele surgiria como consequência do desenvolvimento histórico das sociedades industriais modernas e o seu processo de urbanização crescente. Enquanto os setores mais organizados das classes trabalhadoras tendem a extrair do seu próprio meio os representantes políticos, a massa amorfa e menos organizada flui para lideranças carismáticas cuja atuação é pontual no atendimento de demandas específicas.

Mesmo quando existe forte influência dessas lideranças via centrais sindicais e associações de categorias, como no caso de Vargas, no Brasil, e Perón, na Argentina, a inclinação política de trabalhadores cimenta-se em forte ligação emocional com a figura do líder popular. Na configuração mais geral, o populismo se assenta num pacto de classes, não isento de tensões e conflitos, principalmente em épocas de crise econômica, mas via de regra secundários.

No período clássico do populismo no Brasil (1945-1964), as camadas populares urbanas vinculavam-se a aliança multiclassista através de suas lideranças populares. Se, por um lado, não participavam diretamente do poder e muitas vezes eram apenas massa de manobra, por outro, não podiam deixar de ser levadas em consideração pelo sistema político e dele extrair algumas vantagens econômicas e sociais.

Com o golpe civil-militar de 1964, o sistema populista entra em colapso no Brasil. Octávio Ianni (1926-2004) critica parte da esquerda que se utiliza desses métodos de mobilização, afirmando que levam à capitulação, ou ao autoritarismo, quando a burguesia se utiliza do terror fascista para conter a organização, pela base, da classe operária e demais trabalhadores (O colapso do populismo no Brasil).

Todavia, o termo ‘populismo’ tem ressurgido na mídia e na voz dos intelectuais orgânicos do capital com outro viés semântico. Com frequência, ele é apontado pelas forças políticas de tendência liberal/conservadora como demagogia praticada por determinados políticos e partidos para aliciamento de votos e prestígio junto às classes sociais de menor poder aquisitivo seduzidas por distribuição de bens e serviços públicos à população (populismo de esquerda), e a setores da classe média urbana, por meio de promessas de restauração da moralidade no trato da coisa pública (populismo de direita). O atendimento das demandas provenientes desses estratos sociais reforçaria, segundo esta visão, o poder das lideranças populistas em detrimento das forças políticas mais comprometidas com a higidez das contas públicas e a racionalidade administrativa do Estado, trazendo desequilíbrios fiscais perturbadores da estabilidade econômica.

Toda e qualquer proposta ou decisão que favoreça as classes mais vulneráveis, garanta direitos sociais e/ou implemente políticas públicas de combate à desigualdade é prontamente desqualificada como sendo ‘populismo’, em contraposição às medidas técnicas e racionais recomendadas por especialistas do campo liberal alinhados com os interesses do ente metafísico chamado Mercado, numa construção ideológica que surge no período histórico Reagan/Thatcher e que ganhou corpo no Brasil em meados dos anos de 1990. O receituário liberal composto pela austeridade fiscal a todo custo, defesa do Estado mínimo, abertura econômica irrestrita (mesmo sem contrapartida), o discurso da gestão eficaz e seus modelitos fugazes é visto como a única alternativa de gestão da coisa pública. There is no alternative!, costumava dizer a senhora Margareth Thatcher (1925-2013).

Pelo menos até o final dos anos 1970, o populismo foi encarado com desconfiança por diferentes correntes político-ideológicas, tanto de esquerda quanto de direita. O termo costumava ter sentido pejorativo, sendo usado como arma de combate discursivo, para a desqualificação do oponente. Hoje ele ressurge no arsenal da ideologia liberal/conservadora pró-globalismo econômico como arma de embate ideológico contra qualquer forma de proteção social e de defesa dos interesses nacionais.

 
 
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