A AFBNDES, o BNDES e a democracia
 

Marco Aurélio Cabral
Engenheiro do BNDES
 
No começo dos anos 80, a sociedade brasileira realizou um pacto pela democracia. A partir daí a esquerda, até então radicalizada, depôs armas.

Da mesma maneira, os militares brasileiros, desgastados pelos longos anos de exercício da política, se retiraram do centro da vida pública nacional, abrindo-se espaço para o retorno da pluralidade democrática. Da convivência de multiplicidade de interesses e manifestações resultou o pacto democrático de 1982.

A bomba do Riocentro mostrou que o pacto não seria fácil de ser cumprido. O conservadorismo excessivo levou ao ódio e ao fracasso. Não obstante, prevaleceu a tolerância entre visões distintas de mundo, prevendo-se a possibilidade de alternância de poder em regime democrático. Mais uma vez os brasileiros buscaram acomodar, no devir da formação histórica, forças centrífugas aparentemente inconciliáveis. Houve a busca de consensos como estratégia nacional.

A partir de 2015, contudo, o restrito grupo que assumiu o controle político sobre os meios econômicos do Estado brasileiro tem promovido o desmonte das instituições públicas. A pretexto de princípios de eficiência e tamanho extraídos de doutrina ultra neoliberal, mas sem qualquer legitimidade, promovem-se mudanças organizacionais importantes e, até certo ponto, irreversíveis.

No caso do BNDES, consultoria estrangeira contratada com dispensa de licitação por dezenas de milhões de reais afirma, em documento denominado "VISÃO 2035: Brasil, país desenvolvido", que:

"É preciso criar condições para o florescimento de novos negócios, mercados e empresas, e o BNDES pode contribuir muito por meio de: ampliação do acesso a crédito para micro, pequenas e médias empresas (MPME), indução da boa gestão e governança em médias empresas com potencial, apoio a projetos inovadores e de alta tecnologia, e revisão das políticas de conteúdo local, favorecendo o comércio exterior e ganhos de produtividade com importação de bens e serviços". [Bernardo&Martins, 2018]

Ou seja, nada de novo além de redução das exigências de conteúdo nacional! Não há nenhuma palavra sobre apoio aos entes subnacionais, a setores específicos, à agenda de meio ambiente!

Não obstante, há atualmente no BNDES projeto em curso que prevê que "os alinhados" prevalecerão sobre os demais, sem qualquer compartilhamento de poder com o contraditório. Contratados novamente com dispensa de licitação, os consultores estrangeiros irão sugerir "mudanças organizacionais" em breve.

A AFBNDES terá nos próximos meses papel fundamental na defesa da livre expressão crítica dos funcionários. Aqui no BNDES a sociedade brasileira investiu pesado. Não há nem narrativa "verdadeira", nem "universal", que legitime e justifique a censura ao pensamento crítico interno à organização. Isso faz parte da democracia.

 
 
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