Opinião

Edição nº1483 – sexta-feira, 11 de março de 2022

As empresas onde você trabalhou ainda existem?

 Israel Blajberg

 

 Aposentado do BNDES

1968. Ao me formar, encontrei um Brasil pleno de empregos. Eu simplesmente desconhecia que o mundo não era sempre assim... tudo tão facil. Logo consegui um bom emprego na Standard Electrica S/A, uma fábrica da multinacional americana (ITT) em Vicente de Carvalho, onde hoje é o Shopping Carioca. Mas era possível voar mais alto. Eu era curioso, irrequieto, descobri que a vetusta The Western Telegraph Company Limited estava abrindo uma empresa de consultoria, chamada WESTEC - Western Serviços Tecnicos Ltda. Fui lá, encontrei um simpático inglês que me contratou como Diretor Técnico. Tinha apenas 9 meses de formado, meu antigo chefe da SESA dizia que eu estava começando por onde ele gostaria de terminar a carreira. Mas o sonho ainda iria mais alto. Continuei me mexendo, descobri que a MONTREAL Engenharia também ia entrar nas Telecomunicações, através da MONTOR S/A Projetos e Sistemas. Fui lá, me contrataram como Coordenador de Projetos. A cada salto, o salário dobrava.

1973. Casamento com Marlene, logo a cegonha trouxe duas crianças. Então o mundo veio abaixo. A Guerra do Yom Kippur determina a primeira crise do petróleo, pegando o Brasil desprevenido, altamente dependente do petróleo árabe. A economia sofre um baque terrível. Perdi o emprego e foi difícil arranjar outro. Provei o gosto amargo do desemprego durante alguns poucos meses, o suficiente para saber como é desagradável. Um colega me deu a mão, fui admitido na INDUCO. Era uma fábrica de elevadores que aproveitando o renascimento das Telecomunicações Nacionais passou a fabricar equipamentos para o setor. Instalada em uma espécie de depressão no terreno, na Rua Fonseca Telles, em São Cristóvão. Da rua não se via a fábrica. Não era grande coisa, mas não havia outra opção. Mas ali ficaria apenas cerca de um ano.

1975. Um belo dia o jornal publicou um anuncio: um certo BNDE convoca para concurso público. Eram 30 vagas para cada especialidade. Engenharia, Economia, Direito e Contabilidade. O resto já sabemos, era o começo de uma história fantástica, que durou 36 anos maravilhosos. No dia em que soube da aprovação, avisei os colegas: pessoal, vou deixá-los... um antigo funcionário me deu os parabéns, ao que retruquei, ora vou ser apenas um número ... ao que ele completou: sim, mas um número RESPEITADO. E foi isso que aconteceu. Era um senhor idoso, cujo filho também trabalhava lá, no nosso mesmo Setor de Vendas. Mas porque estou contando tudo isso? Porque todas essas empresas não existem mais, a não ser o nosso querido BNDES. Desapareceram a SESA, WESTERN, WESTEC, MONTREAL, MONTOR e INDUCO.

Década de 80. Viagem para visitar uma fábrica com o Grupo de Análise. Durante o almoço, conversa vai, conversa vem, o empresário nos conta que ele nunca contratava ninguém que havia trabalhado em empresas extintas. Então pensei com meus botões... ainda bem que já estou empregado... pois pode haver outros assim. O almoço foi em uma bela churrascaria campestre, ampla, agradável. Despedimo-nos, e nunca mais ouvi falar da empresa. Anos depois, uma notícia no jornal me chamou a atenção. Houve um assalto em uma churrascaria. Com a chegada da polícia, um tiroteio ocorreu com os bandidos atirando a esmo, e um dos clientes foi atingido mortalmente.  Não pude acreditar, mas não havia dúvida. Sim, era ele, o empresário, na mesma churrascaria.

Como sói acontecer em casos assim, a empresa se ressentiu com a terrível perda, a sucessão mostrou-se impossível, afinal o finado ainda era jovem, e a consequência foi o fechamento da empresa.

Em meus pensamentos naqueles dias tristes, mentalizei que os funcionários, agora com uma empresa extinta em seus currículos, viessem a encontrar novos empregos, onde o fato não tivesse maior significado.

Recentemente, tomei conhecimento que aquela tradicional churrascaria, existente há mais de meio século, não resistiu ao impacto da terrível pandemia que assola a Humanidade, e acaba de fechar as portas.

O tempo passou. Ao recordar estas antigas historias, constato que percorri incólume a Estrada da Vida. No caminho, muitas alegrias, e algumas poucas tristezas, pelo que, contrito, agradeço ao Eterno, Rei do Universo, que nos deu Vida, nos sustentou e nos fez Alcançar este Momento! 

P.S. Esta é uma história ficcional. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência.

Colaborações podem ser enviadas para a redação do VÍNCULO através do e-mail vinculo@afbndes.org.br. Lembramos que as opiniões emitidas nos artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores.

 

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