De que AFBNDES precisamos

Arthur Koblitz

Vice-presidente da AFBNDES

Algumas premissas. Não é pequena a probabilidade de que o resultado das próximas eleições conduza ao poder uma administração absolutamente hostil ao BNDES. Como os que têm acompanhado entrevistas e debates podem concordar, demagogos estão convencidos de que dá voto dizer que o BNDES é um antro de corrupção, e outras coisas mais. Arriscaria dizer que, por mais extraordinário que possa parecer, o BNDES tem sido mais citado, claro negativamente, do que a Petrobras nesses eventos.

Arrancaram nossa taxa, tomaram e tomam nosso funding, tentaram nos criminalizar – para justificar as duas primeiras medidas. Nenhuma conspiração secreta. Conspiração sim, mas aberta e divulgada para quem fizesse algum esforço de obtenção de informação. Para dar uma evidência disso, pergunte-se: como pode ter sido o BNDES o principal alvo de denúncias de corrupção, quando na Caixa operava a turma do Cunha? Examine-se as outras instituições de desenvolvimento do país, e explique porque o BNDES foi o principal alvo da reforma.

Não temos uma cultura de debate aberto, franco, de ideias. Qual a razão disso, não tenho claro. Curioso que segundo os mais antigos, muito antigos, os que relatam histórias dos anos 80, já fomos uma instituição marcada exatamente por debates como esses. Seja qual for a razão que nos desviou desse caminho, acredito que esse seja um fato. Isso explica que nossos altos executivos não sejam propriamente lideranças com capacidade de persuasão de seus times. De fato, convencer equipes, tradicionalmente não tem sido uma questão. Curioso, mas sem deixar de ser sintomático, que tenha sido um crítico-profeta radical que, sem constrangimentos, tenha proclamado como sabedoria nesse jornal: "manda quem pode, obedece quem tem juízo".

A outra face da moeda é um grupo de subordinados dóceis em reuniões e colegiados, e desconfiados, propensos a acreditar em quase qualquer rumor sobre as ações de seus chefes.

Naturalmente que essa é uma caricatura, certamente não é verdade para todos, talvez nem para a maioria, mas certamente para uma parte importante do Banco.

É claro que, nesse ambiente, problemas de comunicação operam como pequenos erros em sistemas não lineares caóticos.

Últimas premissas.

Estamos no mesmo barco, tanto o andar de cima como o andar de baixo sofrerão inesperados ajustes se a canoa furar. O fato, provavelmente correto, de que o andar de cima tem mais acesso a botes salva-vidas, não altera a indesejabilidade e imprevisibilidade do plano de escape.

E para – quero acreditar – a maioria, que está convencida que somos necessários, crucialmente necessários, para o país, dói, emociona, ver o prospecto de um país que um dia sonhamos que podíamos ser se desfazer dessa forma. Éramos o país do futuro, e agora amargamente experimentamos essa esperança (miragem?) se desfazer. Nosso Banco é um dos símbolos de uma audácia, de uma confiança que algum dia tivemos.

Sua destruição simboliza o fim desse sonho e a vitória de um Brasil que sempre fomos também. Uma área de exploração para vantagem dos que aqui não tinham seu interesse e identificação fundamental. Uma das cinco sociedades na história da humanidade que já teve sua economia assentada na escravidão. Marcada definitivamente pela irradiação nefasta que essa instituição propagou sobre todas as esferas sociais: a normalização do autoritarismo, a perversão, a indiferença em relação ao humano, o cinismo sobre todas as instituições políticas importadas da civilização.

Olhando da perspectiva dos que nos anos 80 iam para a rua em defesa das Diretas, como foi o caso da AFBNDES, nossa democracia que parecia prometer soluções sociais para um país dinâmico como nenhum outro, mas profundamente injusto, nos legou um país estagnado e quase tão desigual. Esta semana o candidato que representa a ditadura que acreditávamos que tínhamos deixado para trás sorriu desafiadoramente de tudo o que achávamos que construímos, ou supostamente deveríamos ter construído nesses últimos 30 anos. Explorou sombriamente todas as contradições que constituem a base da Nova República.

Alguns colegas mais antigos não querem ver que estamos num momento diferente, único. Não é apenas mais uma crise. É A Crise da nossa instituição. Alguns mais novos, não chegaram a entender o que significa o BNDES. Afinal, o emprego, no Rio de Janeiro, é tão bom, as condições que oferecem tão transformadoras de vidas pessoais, que isso marcou mais a experiência do que qualquer outra coisa. A ficha precisa cair agora.

Agora algumas conclusões.

Precisamos estar juntos. Alguma coisa, seja lá o que for, precisa estar rodando quando chegar o novo governo. Precisa pelo menos parecer que está rodando. Chamemos isso de "reestruturação" e/ou de "planejamento estratégico".

Executivos e técnicos precisam se superar nesse momento. De um time espera-se responsabilidade. Nunca a tentação da demagogia, do aplauso fácil, foi tão perigosa. Que não se confundam independência em relação à Diretoria e compromisso com o corpo funcional com demagogia barata. Precisamos elaborar críticas construtivas, apresentar alternativas.

De outro time, espera-se a lealdade com suas equipes (todo executivo tem esta dupla lealdade com subordinados e com seus superiores) e com a instituição e menos mesquinhez, foco em vantagens pessoais, em ascensões de carreira. E ainda a compreensão de que se a união é necessária ela não deve ser confundida com aceite automático de propostas que venham de cima. Para liderar é preciso ouvir, ouvir até coisas desagradáveis sobre ideias queridas. É preciso mostrar que de fato há disposição de corrigir rumos traçados. Para ser de todos, as mudanças devem convocar, mesmo que tardiamente, a participação de todos.

Eu defendo que a AFBNDES se coloque à altura desse momento, nem demagógica e irresponsável, nem submissa e caudatária de qualquer Diretoria, e assim dê sua contribuição em defesa do BNDES e do Brasil.

 
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