Conhecimento e
know-how de produção
estão embutidos nas
redes sociais
produtivas, assim como o
conhecimento tácito dos
grandes músicos e
artistas está "embutido"
nessas pessoas. O
aprendizado produtivo
relevante é social: nas
economias, pessoas
aprendem com outras
pessoas mais experientes
sobre como fazer coisas
em geral e produzir bens
e serviços. Não é
possível ser um médico
sem antes ter feito
residência, ou ser um
controlador de tráfego
aéreo apenas tendo lido
livros e manuais sobre o
tema. O mesmo se aplica
à capacidade de produzir
computadores, carros,
aviões, pneus e qualquer
outro bem ou serviço. O
aprendizado produtivo
tem aspectos
experimentais e sociais
que dificultam a
acumulação de
know-how e
conhecimento,
condicionando-a a
condições preexistentes
nas economias e
sociedades. A destreza
oriunda em alguma
atividade está vinculada
a destrezas (cognitivas)
de ordem superior, e
estas só ocorrem quando
existe um certo nível de
fluência em um certo
tipo de conhecimento. A
leitura rítmica,
harmonia e técnica para
o músico e boa técnica e
preparo físico para o
tenista são os
requisitos para esse
tipo de profissional de
sucesso. Assim,
desenvolvimento
produtivo e educacional
são complementares na
tarefa de promover o
desenvolvimento
econômico.
Como os antigos
economistas clássicos do
desenvolvimento já
destacavam, há uma
circularidade em toda
essa discussão sobre o
conhecimento produtivo
tácito contido nas redes
produtivas locais. Se o
país não tem um parque
produtivo relevante onde
as pessoas possam buscar
esses conhecimentos,
tudo fica difícil, pois
elas não aprenderão isso
nem na escola nem na
faculdade. Para fazer
relógios, um país
precisa de especialistas
e relojoeiros, mas se
ali não existem empresas
que produzam esse bem,
não há incentivo para
que esse tipo de
trabalhador e de
especialista se mova
para lá. Trata-se de uma
típica "falha de
mercado", apontada pelos
economistas clássicos do
desenvolvimento.
Aqui R. Hausmann destaca
o papel fundamental do
Estado para ajudar a
iniciativa privada a
resolver esses
problemas. Hausmann
sugere que o Estado
poderia funcionar como
um identificador de
oportunidades de
diversificação produtiva
e como um agente de
coordenação, trabalhando
para ajudar a iniciativa
privada a ocupar esses
espaços. Não se trataria
de "escolher
vencedores", mas de
trabalhar em conjunto
com a iniciativa privada
para buscar ganhos
relevantes de
produtividade, avançando
na direção de
diversificação produtiva
e de upgrading
tecnológico, na linha do
que fizeram os governos
de sucesso do Leste
Asiático.
A metáfora da floresta
do desenvolvimento
econômico, criada por
Hausmann e Hidalgo,
também ajuda a entender
melhor as dificuldades
do processo de mudança
estrutural que aumenta a
complexidade das
economias. Imagine que o
espaço produtivo do
comércio internacional
seja uma floresta onde
cada árvore representa
um produto. Árvores
próximas representam
produtos "próximos", que
requerem capacidades
similares para serem
produzidos: por exemplo,
camisetas e blusas, ou
motores a combustão e
carburadores. Árvores
muito distantes
representam produtos que
não exigem capacidades
similares para serem
produzidos: petróleo e
aviões, bananas e
microcircuitos de
computadores. O Atlas
da Complexidade
calcula essas
proximidades como a
probabilidade de dois
produtos serem
coexportados, conforme
vimos acima. Imagine
agora que cada empresa é
um macaquinho que habita
uma árvore ou se
especializa em produzir
algo. As diferenças
entre países no comércio
internacional podem ser
entendidas como árvores
que já foram colonizadas
por macaquinhos. Países
ricos têm florestas
densas com muitos
macacos em muitos tipos
de árvores já
colonizadas, um tecido
produtivo complexo;
países pobres têm poucas
árvores, colonizadas por
poucos macacos. Para se
desenvolver, um país
precisa que seus macacos
pulem para árvores não
colonizadas, ainda
vazias.
A metáfora é boa para
ilustrar a natureza
cumulativa e marginal do
desenvolvimento
econômico. Os
macaquinhos só conseguem
pular entre árvores
próximas, não conseguem
dar grandes saltos para
alcançar as árvores do
outro lado da floresta.
Ou seja, as empresas vão
migrando para atividades
similares, provavelmente
mais lucrativas, a
partir dos conhecimentos
e habilidades que já
têm, o mesmo valendo
para seus trabalhadores.
Um exemplo interessante
é o caso da Bombardier,
canadense, que usou seu
enorme sucesso e
conhecimento em veículos
de neve e snowmobiles,
com destaque para o
Ski-Doo, para entrar no
mercado de veículos para
diversão náutica,
licenciando e produzindo
em grande escala o
Sea-Doo. Aqui, aparece
de novo a questão
relevante do ovo e da
galinha e a necessidade
de coordenação para que
o processo de
desenvolvimento se
desdobre. Sozinhos, os
macaquinhos terão muita
dificuldade de colonizar
as árvores frondosas e
distantes que estão do
outro lado da floresta.
(*) Publicado na edição
1247, em 18/5/2017.