Assim como furacões de
categoria 5 viram, com
frequência, uma
tempestade tropical, a
pandemia atual pode ter
efeitos menos deletérios
à humanidade do que
promete hoje. Ainda
assim, o estrago será
grande; dificilmente
escaparemos dos milhões
de mortos e de uma
depressão econômica
global.
O
projeto neoliberal, que
já fazia muita água,
naufragou e, com ele, os
principais preceitos
norteadores dessa linha
de pensamento econômico
dominante em escala
mundial desde a era
Reagan/Thatcher. Um
desses preceitos, o do
Estado mínimo,
mostrou-se, com a
pandemia atual, uma
distopia desastrosa e
inviável sob qualquer
aspecto: político,
econômico, militar,
cultural, sanitário,
educacional
etc.,
justo quando mais
precisamos do Estado e
de seus agentes
públicos.
A desregulamentação da
economia, em especial,
do mercado financeiro
com suas bolhas
especulativas, caducou.
Em tempos de pandemia, a
volatilidade do mercado
especulativo manifesta
na explosão de bolhas,
no pânico das bolsas e
na instabilidade do
crédito é fator de
agravamento exponencial
da crise, na medida em
que ocorre a aglutinação
de vetores
epidemiológicos com
econômicos. A
globalização é um
período de crescimento
da produção e do
comércio mundiais. Mas a
riqueza concentrou-se
num pequeno grupo de
países e isso reforça a
desigualdade entre as
nações. A desigualdade
ampliou-se, inclusive em
muitos países centrais
do sistema capitalista.
O
tema do socialismo volta
à baila
desligado
do
culto do Estado Todo
Poderoso. Se a
estatolatria deve ser
superada, o culto ao
mercado livre leve e
solto, idem. Nesse
ponto, as instituições
democráticas serão
chamadas a passar por
profundas
transformações, visando
sua adaptação
institucional à nova
situação do mundo. Dois
aspectos merecem
atenção: o primeiro
–
a combinação entre a
força criativa da
economia privada e o
papel do Estado enquanto
elemento regulador das
regras do processo
produtivo, investidor
seletivo e principal,
bem como, provedor das
demandas sociais, via
políticas públicas
voltadas para a saúde
preventiva, a educação
de qualidade, o
transporte de massas e a
segurança com respeito
aos direitos
fundamentais do ser
humano. O segundo
aspecto prende-se à criação
de mecanismos
democráticos mais
complexos e que devem ir
além do mero formalismo
de eleições e
manifestações
esporádicas (sem
desmerecer esses
elementos da vida
democrática).
A onda reacionária
espraiada mundo afora
não apresenta nenhum
caminho que não seja o
da implantação da
barbárie. Não por acaso,
grupos neofascistas,
fundamentalismos
religiosos e
anticientíficos ganham
espaço de comunicação na
internet e de ação
política nas ruas. Eles
dependem da alienação,
do medo e da desilusão
das massas para
progredir em meio ao
caos que cultivam. O
coronavírus é seu aliado
não confesso.
Países, como o Brasil,
que têm promovido o
desmonte de
empresas
estatais e demonizado as
instituições públicas,
ao se depararem com
pandemias e outras
tragédias em grande
escala, encontram-se em
situação de extrema
vulnerabilidade; não
conseguem dar respostas
articuladas, abrangentes
e estruturadas para
problemas sociais que só
o aparelho de Estado é
capaz.
Não é da natureza da
iniciativa privada ir
muito além dos seus
interesses econômicos
mais imediatos.
As
conquistas da
civilização nos últimos
séculos podem
dissolver-se no ar como
fumaça diante da atual
crise mais rapidamente
do que poderíamos supor
anos e até meses atrás.
O mundo pós
Covid-19
será algo bem diferente;
melhor ou pior...? Em
aberto: a depender das
escolhas políticas e
econômicas a serem
feitas. Os papeis do
Estado e da iniciativa
privada, daqui
para
frente, estarão diante
de nós como
uma esfinge com duas
cabeças para deciframos
ou sermos
devorados. |