PAS – Manter ou Mudar?
Parte Dois

Ruy Siqueira Gomes

Economista do BNDES, ex-diretor de Seguridade da FAPES

"Se acha que a competência custa caro, experimente a incompetência"
Miguel Monteiro

"Viveram infelizes porque custava menos"
L. Longanesi

Na primeira parte deste artigo, publicada no VÍNCULO 1.309, de 10/08/2018, tecemos uma breve análise sobre a qualidade do PAS e sua comparabilidade com o que é oferecido pelos planos de saúde de mercado. Naquele texto, fiz a opção de abordar o tema pela ótica da minha experiência, sem maiores preocupações com dados históricos. Esses números, porém, existem, e não são pouco relevantes. Um exemplo são as estatísticas da ANS sobre nosso plano de saúde, apresentadas por Thiago Mitidieri em artigo publicado no VÍNCULO de 02/08/2018. Outros, menos tangíveis, mas muito mais importantes, foram exemplificados na edição 1.310 desse mesmo periódico, por meio de depoimentos de titulares que tiveram vidas preservadas pela assistência do PAS.

Nesta edição, seguindo o compromisso estabelecido na primeira parte deste artigo, trataremos dos custos do PAS. Para a adequada abordagem desse tema, será necessário trazer informações e números que são desconhecidos pela maioria dos benedenses. Portanto, sem mais delongas, vamos a eles.

2. Qual a natureza e dinâmica dos custos do PAS?

Em primeiro lugar, é importante que todos saibam que os gastos com o PAS são integralmente reembolsados à FAPES pelo BNDES. A Fundação não aufere qualquer lucro com a operação do plano de saúde e recebe do Banco apenas os valores equivalentes aos seus dispêndios, o que inclui, obviamente, suas despesas administrativas. Importante destacar que a FAPES opera também o plano previdenciário. Dessa forma, as despesas administrativas da Fundação são rateadas entre PBB e PAS segundo critérios previamente definidos, o que é uma prática usual em qualquer empresa de mercado que atue em mais de uma linha de negócios. Como resultado, despesas comuns, tais como segurança de sistemas, manutenção predial e mesmo salários de diretores, são compartilhadas, contribuindo para que cada linha de negócio arque, ao final, com um valor total menor do que teria se possuísse uma estrutura de suporte exclusiva para si.

Mesmo sendo o conjunto de custos e despesas de nosso plano de saúde integralmente coberto por nosso empregador, é fundamental que seja eficazmente gerido e, de preferência, que estes valores se mantenham compatíveis com os incidentes em planos de saúde de mercado. De outra maneira, por melhor que seja o PAS, será difícil defender sua manutenção no longo prazo em um ambiente de crescente transparência e escrutínio por órgãos de controle e sociedade. E, pessoalmente, acho justo que seja assim.

De forma geral, os custos diretos do PAS ou de qualquer outro plano de saúde podem ser divididos nas categorias que seguem: internações, exames, consultas, terapias (fisioterapias, psicoterapia, etc.) e outros serviços ambulatoriais. O Instituto de Estudos de Saúde Suplementar – IESS – é uma organização sem fins lucrativos que acompanha a evolução desses custos nos planos de mercado. Segundo seu último relatório, que apresenta dados de fechamento de 2016, tais custos estavam da seguinte forma distribuídos:

Na composição dos gastos totais dos mantenedores (empresas e/ou beneficiários) dos planos de saúde devem ser somadas as despesas administrativas e, ao menos no caso dos planos de mercado, os lucros ou as perdas das empresas que oferecem o serviço. Assim, no cômputo total, enquanto os custos diretos representados no gráfico anterior respondem por 85% dos gastos para manutenção de um plano de saúde, despesas administrativas perfazem outros 12% e os lucros equivalem a apenas 3%. Estes dados foram publicados pelo IESS e dizem respeito aos números das operadoras aferidos em 2015.

Na minha experiência como gestor do PAS, verifiquei que a distribuição percentual dos nossos custos entre as categorias internação, exames, consultas e terapias possuía bastante aderência aos dados publicados pelo IESS. Nossas despesas administrativas, por outro lado, embora venham perdendo relevância ao menos desde 2013, ainda eram mais elevadas, girando em torno de 19% do total desembolsado pelo BNDES para reembolso à FA-PES em 2017. Considerando, porém, que o PAS não aufere lucro, temos uma diferença de dispêndio que favoreceria à média dos planos de mercado em apenas 4%. O que muitos se esquecem de considerar, no entanto, é que nosso plano, ao contrário dos usualmente oferecidos no mercado, é também um plano odontológico. Enquanto as despesas administrativas dessa categoria, segundo o mesmo relatório de 2015 do IESS, responderam por 24% dos dispêndios, a lucratividade dos mesmos atingiu a impressionante média de 30%. Nesse contexto, não vejo grande disparidade no percentual registrado para as despesas administrativas do PAS, ainda mais quando consideramos que, ao contrário dos custos diretos, essas despesas tendem a não crescer proporcionalmente ao número de vidas geridas. Se os planos de mercado fazem, em sua maioria, a gestão de centenas de milhares de vidas, o PAS responde atualmente por menos de 11 mil.

Outra informação extremamente relevante para o escrutínio das despesas administrativas do PAS é sua conexão com os custos diretos do plano. Se as primeiras, como já informado aqui, não atingem sequer 20% do dispêndio total, os segundos, com destaque para os custos de internação, são responsáveis pela maior parte do desembolso. Apesar de tal disparidade de relevância, é fundamental perceber que existe uma relação direta entre o investimento em bons recursos administrativos e a adequada gestão dos custos mais representativos. Apenas como principais exemplos, vejamos:

• Processo de autorização: os principais procedimentos demandados à FAPES passam pela revisão da equipe médica, que somente os autoriza quando verifica sua conformidade e real necessidade para a saúde do paciente. Quando o corpo técnico detecta algo que parece inadequado, é recomendada ao solicitante uma segunda opinião médica mais qualificada, o que muitas vezes leva o paciente à resolução de seu problema com menor impacto para sua qualidade de vida e, simultaneamente, com menores custos para o PAS.

• Custos de internação: anualmente, a equipe do PAS negocia com cada rede de hospitais as tabelas para pagamento dos mais diversos procedimentos. Esse processo, extremamente relevante para o controle dos custos de internação em qualquer plano de saúde, demanda uma equipe experiente e extremamente capacitada. A FAPES há tempos vem sendo uma referência para as autogestões, obtendo ótimas negociações, com tabelas diferenciadas e, consequentemente, menores custos.

Por fim, para seguir nossa análise com foco nos dispêndios totais do PAS e encerrar este já demasiadamente extenso interlúdio a respeito das despesas administrativas, meu testemunho é que estas últimas, em sua maior parcela, representam hoje um investimento na manutenção de um corpo funcional que faz exatamente a diferença já discutida na primeira parte do presente artigo. É evidente que tais despesas precisam ser bem geridas para que mantenham adequada compatibilidade com as observadas no mercado, mas, ao menos em minha opinião, quaisquer cortes precisam considerar a natureza e a importância do que está sendo eliminado. Do contrário, haverá o risco de comprometermos a excelência, que sempre foi a principal característica de nosso plano de saúde.

Para compreender a evolução dos gastos totais do PAS, é preciso antes conhecer um conceito denominado "inflação médica", o qual busca refletir o crescimento médio do conjunto de custos e despesas dos planos de saúde. Infelizmente, o que vem se registrando, ao longo dos anos, é uma inflação médica sempre bem maior que a inflação sentida pela população em geral. Isso ocorre em função de diversos fatores, dentre os quais se destacam os avanços tecnológicos na área da saúde, que vêm sendo introduzidos de forma cada vez mais acelerada e custosa, e o envelhecimento da população, uma vez que existe uma relação diretamente proporcional entre a idade dos beneficiários e os custos esperados com eles.

Um dos índices que mede a inflação médica é o VCMH (Variação de Custos Médico-Hospitalares). Segundo informações do site www.vcmh.com.br, de autoria do Grupo Case Benefícios e Seguros, este indicador expressa "a variação do custo das operadoras de plano de saúde comparando dois períodos consecutivos de 12 meses, captando oscilações, tanto da frequência de utilização quanto do preço médico, dos serviços de assistência à saúde". Ainda de acordo com essa mesma fonte, o cálculo do VCMH contou em 2016 com uma amostra de 1,06 milhões de beneficiários.

A evolução do VCMH até dezembro de 2016, último valor publicado até o momento, pode ser observada no gráfico apresentado a seguir, conforme extraído de publicação da IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar).

Cientes, portanto, que, ao menos desde 2011, a inflação médica registrada tem sido significativamente superior à inflação geral, observemos, a seguir, a evolução dos custos do PAS no período recente.

Em 2017, sem perda na qualidade dos serviços oferecidos aos beneficiários, conseguimos quase eliminar o crescimento nominal dos custos do PAS, que, ao longo dos anos anteriores, vinha ocorrendo em índices bem superiores à inflação. Na verdade, em termos reais, considerando a inflação medida pelo IPCA, 2017 representou uma redução efetiva no total dos desembolsos efetuados pelo plano. Para obter este resultado tão positivo, não foi necessária nenhuma mágica, mas apenas o apoio do corpo funcional da FAPES na busca por oportunidades de melhoria. Assim, em um curto espaço de tempo, introduzimos diversas iniciativas que trouxeram melhor gestão dos recursos, tais como mudanças nos processos de compras de medicamentos e materiais, renegociações das principais contas de internação e transição de parte das desospitalizações para instituições especializadas e de menor custo. Além dessas, outras tantas melhorias já estavam em desenvolvimento para futura implantação, prevendo-se que nos dessem um retorno ainda melhor em 2018. Por fim, em linha com o que existe de mais moderno no mercado de saúde suplementar, estávamos aumentando a adesão ao Programa Amparar, que, em suas diversas iniciativas, foca na prevenção para garantir uma vida saudável aos beneficiários, consequentemente reduzindo os custos futuros com internações, que, como já mencionado, representam a maior parte dos gastos de qualquer plano de saúde.

Como os números parecem deixar claro, a administração própria do PAS apresentava e ainda apresenta oportunidades diversas para redução dos dispêndios. O Programa Amparar, em especial, é um tipo de iniciativa que dificilmente poderia evoluir todo o seu potencial sob a gestão de um plano de mercado. Uma vez que a FAPES faz a gestão conjunta do ambulatório e do plano de saúde do BNDES, existe um potencial enorme para que o gerenciamento combinado dos dados da saúde dos empregados seja utilizado ativamente pela Fundação para fins de prevenção. O Amparar já estende esse monitoramento aos aposentados identificados em grupos de risco e tinha como visão de futuro a ampliação desse serviço. Como resultado, a expectativa é oferecer melhor qualidade de vida a todos os beneficiários e custos decrescentes para o PAS.

Para os bravos leitores que chegaram até aqui, corajosamente sobrevivendo à avalanche de informações apresentadas nestas mal traçadas linhas, resta uma reflexão final: diante de todo este cenário, como seria possível a uma empresa de mercado oferecer um plano de saúde com serviços equivalentes ao PAS e com menor custo? Ao menos dentro do meu parco conhecimento, isso só seria viável por meio de dois caminhos: (i) a negociação de melhores tabelas de preços junto à rede credenciada e/ou (ii) a redução de eventuais desperdícios e má utilização do plano inclusive pelos próprios usuários. Em relação ao primeiro ponto, podemos ficar relativamente tranquilos, uma vez que o PAS, além de contar com uma equipe de primeira linha para esse trabalho, costuma ser beneficiado pelo anseio das instituições em contar com o selo de qualidade FAPES na sua lista de clientes. Já no tocante ao segundo, ainda existe trabalho a fazer e este dependerá de todos nós. Mas isso é assunto para a parte final deste artigo. Um abraço e até lá!

 

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