Editorial

Edição nº1379 – quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

A teoria do “esquema de corrupção legal” de Montezano e o que realmente importa

A curiosa teoria de Montezano

O que ele quis dizer?

"A gente (Brasil) construiu leis, normas, aparatos legais e jurídicos que tornaram legal esse esquema de corrupção. A conclusão é essa" (na entrevista coletiva de ontem em Brasília).

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Faltou contexto. É isso. Vamos pegar a citação toda, vai ficar mais claro.

"Nosso Brasil viveu um dos maiores escândalos de corrupção da história, turbinado com dinheiro público. Esse dinheiro saiu dos cofres do povo brasileiro. Então é legítimo que o povo se pergunte e questione: ‘mas como não houve nada de ilegal?’. E a verdade é que a gente concluiu que não houve nada de ilegal. A gente construiu leis, normas, apa-ratos legais e jurídicos que tornaram legal esse esquema de corrupção. A conclusão é essa. E é legítimo que a população tenha essa dúvida, e é importante que o banco esclareça que não fez nada de ilegal".

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Depois disso, não é apenas a "população" que está com dúvida. Todo mundo está com dúvida. O que Montezano quis dizer? As páginas do VÍNCULO estão abertas para o presidente desenvolver seu instigante raciocínio. Essa ambiciosa digressão sociológica, com implicações legais, talvez históricas também.

O presidente estava propondo ser aquele que viria para "explicar". Uma espécie de chosen one. Depois das declarações acima, temos razão de acreditar que, hoje, se há alguém confuso sobre a história da "caixa preta", essa pessoa é o presidente.

Qual é a base para esta confusão? Possivelmente o excesso de pressão e, como não cansamos de destacar, as premissas incompatíveis que Montezano tem que atender: agradar a "doidos" e aos fatos.

Montezano não gosta do apoio bilionário à JBS. Ele é contra. Tão contra que acha que não precisa colocar em discussão o apoio. Ele propõe aprender com os erros do passado, mas não analisa a política, seus acertos e erros. Ele é contra e ponto final. Não importa se cresceu a exportação de carne, se o BNDES ganhou muito dinheiro com as operações, se a qualidade do abate no Brasil melhorou, quanto o BNDES (junto com o mercado) aplicou e quanto a empresa cresceu. Não interessa se faz ou não diferença termos um setor de proteína animal na mão de nacionais ou de estrangeiros. Trata-se de um apoio errado porque foi muito grande e – com base no que ele diz, podemos acrescentar – porque a JBS se revelou uma empresa corrupta. Assim, o apoio do BNDES à JBS é qualificado, paradoxalmente, como corrupto, mesmo que não haja evidência de corrupção. Esse é o conceito do "esquema de corrupção legal" de Montezano. Mau uso da dialética.

Não ocorre ao sr. Montezano que talvez hoje, no seu mandato, o BNDES pode estar apoiando empresas corruptas. O Banco apoia milhares de empresas e continua emprestando montantes significativos para elas. Se sua teoria for correta, ele pode estar se envolvendo em inúmeros "esquemas de corrupção legais", de novo, segundo sua própria definição.

Se um banco financia uma empresa com base em critérios legais – ou seja, sem se envolver em atos de corrupção, e sem o conhecimento de práticas ilegais desta mesma empresa –, seu apoio não pode ser considerado corrupto. Também não pode ser considerado que a sociedade criou leis corruptas para permitir esse apoio. A auditoria, o juiz, as comissões de apuração interna, os fatos apurados nas CPIs, mostram que o apoio foi feito com base em critérios legais e boa-fé. E também não há indicação de que os empregados do Banco estivessem a par de ilegalidades cometidas pela JBS.

E isso vale para todos que se relacionam com uma empresa corrupta, não apenas os seus financiadores. Seus empregados não são corruptos, seus fornecedores não são corruptos etc. – de novo, para ser didático, desde que tenham se envolvido com a empresa com base em critérios legais e não tenham feito parte, ou estivessem conscientes, dos esquemas de corrupção da mesma.

Como poderia fica mais claro o discurso do sr. Montezano? Ficaria mais claro se ele admitisse que existem duas discussões diferentes. A primeira: há ou não "caixa-preta" (falta de transparência ou esquema de corrupção) no BNDES? A segunda: qual foi o balanço das políticas de apoio à exportação de serviços de engenharia e de apoio a empresas nacionais por meio de participações. Ele deveria responder sem rodeios sobre a primeira questão: minha gestão concluiu que não há "caixa-preta" no BNDES. Sobre a segunda questão: eu não gosto das políticas, mas nunca as submeti a qualquer discussão com os técnicos do Banco. Fazemos um apelo: Por favor, e mesmo em benefício da inteligibilidade do seu discurso, pare de confundir as duas coisas. Pare de chamar de corrupta a política que você não gosta.

O triste é que até aquela declaração a apresentação estava muito boa. Parecia que Montezano iria realmente acabar com a crise que ele mesmo gerou com a combinação de falas desastrosas e inexplicável silêncio por 10 dias.

O que realmente importa

Fizemos as contas. O BNDES vendeu em janeiro as ações do Banco do Brasil de posse da União que estava encarregado de vender. Foram vendidas em mesa, como os técnicos do Banco achavam que era a forma mais correta.

Valor apurado com a venda graças à coragem da ex-superintendente Luciana Tito e dos empregados que se mobilizaram no térreo do Banco em outubro de 2019: R$ 1,06 bilhão.

Valor que seria apurado se o Banco tivesse se curvado às pretensões do ex-diretor André Laloni e dos assessores e executivos que o apoiaram e ainda pilotam a área de mercado de capitais: R$ 0,960 bilhão (assumindo um preço médio por ação de R$ 43,46, apurado na oferta pública que ocorreu em outubro com outras ações do Banco do Brasil e descontada a comissão dos bancos).

Diferença entre os valores? MAIS R$ 160 milhões (considerando também aqui os dividendos pagos pelas ações entre outubro/2019 e janeiro/2020).

Estamos falando aqui de mais de três vezes o valor da polêmica consultoria externa (R$48 milhões). Estamos falando de uma diferença de 18%.

Se um erro dessa ordem for cometido na venda das ações de toda a carteira da BNDESPar, estaríamos falando em desvios na casa dos R$ 20 bilhões dos cofres públicos para o bolso do setor privado.

Deixem os técnicos do BNDES trabalhar em paz. Sem usurpação de suas funções por diretores. Sem assessores que agem como diretores ou superintendentes.

E mais, é preciso transparência JÁ sobre a estratégia para a BNDESPar. Qual é a política de reinvestimento? Quando haverá a prometida apresentação para o corpo funcional?

Somos todos ouvidos.

Opinião

O que está por trás da tentativa de afundar o BNDES

Acontece

Ação da CGPAR: ainda existem associados inadimplentes com pagamentos

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EDIÇÕES ANTERIORES

(a partir de 2002)

Acontece

Entrevista do presidente da AFBNDES para o jornal Valor Econômico

O presidente da AFBNDES, Arthur Koblitz, deu en-trevista ontem ao jornal Valor Econômico, que foi utilizada na matéria "Funcionários do BNDES avaliam que Montezano demorou para explicar auditorias externas".

"Ele demorou mais de uma semana para dar explicações sobre o assunto. Ficou em silêncio por dez dias", disse Koblitz. "Acho que [Montezano] fez uma excelente apresentação [na coletiva em Brasília], mas para resolver uma crise que ele mesmo criou [com a demora]", complementou.

Arthur disse ao jornal que a coletiva do presidente encerra a questão de abertura da "caixa-preta" do BNDES: "que deixemos esse pseudo-problema, em que nunca encontraram nada de ilegal nas operações do Banco, para nos dedicarmos a coisas mais importantes".

Mudando o foco, ele comentou que há dúvidas sobre o futuro da BNDESPar. Para Koblitz, não há infor-mações claras sobre qual será a política de reinvestimento da BNDESPar, ou seja, o que será feito exatamente dos recursos originados da venda de participações acionárias do Banco.

"Sabemos que parte da carteira precisa ser vendida, mas a BNDESPar vai acabar? Todos os bancos de desenvolvimento têm braços de participações acionárias", comentou o presidente da AFBNDES, acrescentando que a Associação defende que o processo de venda de ações obedeça a critérios delineados pelos técnicos da Casa.