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O
Piscinão
do
Ramos
–
Notas
para
um
Ensaio
de
Curta-Metragem
(ao
som
de
Higgs
Boson
Blues,
de
Nick
Cave) |
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Personagens que cá
terão curta duração,
ou os homens
avançados nos
cinquenta.
O Ensaísta:
cabeludo, grisalho,
outrora cínico,
agora só sacana (mas
atente: nem sempre o
é). Capricórnio. Só
o Ensaísta, com sua
voz aguda e
irritante, fala nas
cenas encenadas.
O Questionador:
grisalho, de alma e
cabelos revoltos,
palavras entaladas
na garganta.
Capricórnio.
O Diretor: de terno,
sorridente, bem
articulado.
Sagitário.
Em 20.300 dias sobre
a Terra
"And in a way I’m
yearning
To be done with all
this measuring of
proof."
(The Mercy Seat
– Nick Cave)
(Cena S1, área
bancária – o
Ensaísta pagando uma
conta quando se
houve uma voz
imperiosa "...
AGORA...", como um
brado convocando os
eloi
ao subsolo. É
arrastado por dois
amigos grisalhos
para o auditório.
Sentam no lado
esquerdo, fila F.
(Começa a tocar a
música: Higgs
Boson Blues, som
abaixa após o
primeiro verso, "Can’t
remember anything at
all")
(Cena auditório –
plano geral sobre um
grande auditório com
um quarto das
cadeiras bloqueadas
para que as pessoas
se agrupem mais à
frente. Média
ocupação, figurantes
majoritariamente de
meia idade e função
comissionada. Alguns
incorporados e
derrubados
espalhados, ovelhas
negras entre os
chapa-branca. No
palco: duas
cadeiras, um
Presidente de fora e
um Diretor de
dentro. Passam cenas
de documentário do
evento com frases
esparsas da palestra
se superpondo à
música no fundo,
subindo nos versos:
"... running from
his genocidal jaw /
He got the real
killer groove /
Robert Johnson and
the devil, man /
Don’t know who’s
gonna rip off who")
(Cena no
auditório –
fragmento
documentário de
pergunta do
Questionador sobre
nepotismo –
fragmento
documentário de
resposta do Diretor)
(Cena café no S1
– o Ensaísta, o
Questionador, uma
moça mais alta que
os dois)
"O que você não
entende é que o
Ricardo só vê suas
experiências
pessoais.
Ele nunca viu
nepotismo no Banco
porque,
sinceramente, falem
o que falarem,
acredito que ele,
pra ele, em
benefício próprio,
nunca o praticou. E
essas palavras,
ética, meritocracia,
qualificação,
participativo, tudo
isso é de difícil
medição e desigual
definição. Por isso
não costumo usar
essas palavras. Cada
um entende mais ou
menos do seu jeito."
(Cena na baia em
frente ao corredor
do banheiro
masculino, 2º andar
– o Ensaísta e
um homem mais alto,
mais forte, mais
novo)
"Ele entende o mundo
sob o prisma das
operações de exim da
época de FHC. O
cliente era
basicamente um só, a
Embraer, e o Banco
tinha uma relação
continuada com suas
exportações sem
muitas frescuras
sobre questões como
conteúdo nacional,
por exemplo. Esse
entendimento
formador pelo visto
nunca o abandonou."
(Cena na baia
quase em frente ao
corredor principal,
2º andar – um
senhor baixinho e o
Ensaísta, então com
a barba menos
branca)
"Espanha, o cliente
do Banco num projeto
de FINEM não é uma
empresa. O cliente
do Banco num projeto
de FINEM é um
Projeto. A empresa é
quem paga, é quem dá
as garantias, mas
sem o projeto, bah,
a operação não
existe. O dinheiro
só será liberado
conforme o projeto
ande. E se as coisas
começa-rem a ser
muito mudadas, o
Banco pode fazer um
vencimento técnico
da operação. Isso
não é óbvio à
primeira vista: a
gente sempre pensa
cliente como uma
pessoa, física ou
jurídica. Mas nesse
caso o cliente é,
por assim dizer, um
compromisso. E é por
isso que eu gosto de
dizer que estamos
casados com as
operações até que a
amortização nos
separe."
(Cena café no S1)
"Lembra dos
piscinões do Gros,
do cliente-produto?
Lembra da confusão
que foi por conta de
um processo
mal-ajambrado, em
que se atribuiu um
excesso de
atribuições às áreas
de produto, que
estavam nas mãos do
povo da BPAR do
Gros, e que ao invés
de ficarem fazendo
só BackOffice
você ficou com a
situação surreal de
ambas as equipes
irem em visita de
análise? A ideia de
tornar o Banco mais
eficiente pela linha
de montagem... putz,
é fazer disso aqui
um drag de
Banco privado, saca,
um Banco Montado,
hahaha!, Falando
nisso, tem uma
história com a
(...)"
(Cena na baia
frente ao corredor
do banheiro
masculino)
"Você tem que
entender que o
Ricardo tem o mesmo
entendimento de que
um negócio é um
negócio em si que o
Gros tinha. Sabe
aquele lance da
Thatcher de que não
há sociedade, apenas
as pessoas somadas?
No fundo fundo mesmo
a mesma coisa. Se a
melhor solução do
ponto de vista do
custo/prazo do
projeto pra botar
ônibus elétrico
rodando em São Paulo
for comprar ônibus
chinês, whatever,
dane-se o agregado
das contas externas,
os desdobramentos
tecnológicos, a
continuidade
operacional, o ca<<Bip!>>o.
Aquele problema tem
que ser resolvido da
melhor forma e a
solução ótima
daquele problema é a
solução ótima,
f<<Bip!>>-se o
resto, entendeu?"
(Cena café no S1)
"A impressão que me
dá é que, enquanto o
Gros queria reformar
o Banco como um
todo, Ricardo está
na verdade é criando
um banco à parte lá
na ADIG. Vai ficar
um banco legacy,
com os pepinos do
passado e dos
compromissos
históricos com os
setores que estão
morrendo, banco
rádio AM tocando pra
velhinhos, e um
banco com dois
braços bem sarados e
separados: o
processo lean,
enxutinho, e, do
outro lado, o
processo dos grandes
negócios
estruturados, que
não necessariamente
terão empréstimos,
saca? Nada de Laura
de Vison! Vittar!
Puro Vittar! Vittar
e aquele caritcho
todo tatuado meio
sertanejo que eu
esqueci o nome
naquele
clip de
praia. (...)"
"Gros foi a
tragicomédia,
porque, afinal de
contas, aqui é o
Bananão, não tem
tragédia. Agora rola
a farsa – e farsa é
farsa, sem
qualificativos. Nada
de cirurgia, nada de
jairurgia, nada de
marinurgia –
reestruturação de
gênero no cartório
sem o país dar-se
conta. Aí quem sabe
ela sobrevive a quem
vier em 2019. Se
vier Lula recheado
acompanhado de canja
de massa de
estrelinha? Ou se
finalmente vier o
tão desejado
magret ao molho
de jabuticaba,
trajando purê de
barôa
amarelo-canarinho,
seja com chuchu,
seja o pistola?
Tanto faz!"
"Lembra que eu
escrevi que era um
ato de mágica o que
estava rolando? Pois
é: enquanto fica
todo mundo chocado
com essa sacanagem
que sequer o Márcio
Henrique teve o
desplante de fazer,
as movimentações
forçadas, os
dirty dozen que
vão limpar a
m<<Bip!>> que os
caras fizeram nos
verões passados de
Luciano; enquanto
você reclama com
razão da
concentração de
poderes na Área de
Administração,
Recursos Humanos e,
até segunda ordem,
mas só porque a
gente tá de mudança,
tá, de Cobrança –
c<<Bip!>>o!, esse
lance da Cobrança é
de um nível de
bagunça de f<<Bip!>>
– e que esses caras
ditarão quem pode ir
para onde; enquanto
fica gente
insistindo na
p<<Bip!>> da
TJLP-TLP como se
fosse isso que
estivesse entupindo
a descarga do
Banco... cara, a TLP
é só mais uma das
m<<Bip!>> que
eventualmente vai
descarga abaixo logo
no início do próximo
governo... o Ricardo
vai mudando os
procedimentos, os
nomes, quem sabe até
arrancando os
"documentos" do
Banco no futuro,
sacou? Mas o ponto
é: se vier algum
maluco, essa
estrutura nova,
duplicada, à parte,
camuflada no manto
da modernidade, tem
mais chance de
sobreviver. E nisso
tenho que reconhecer
que o cara está
sendo esperto em
todos os sentidos do
dicionário e mais
alguns que ainda
estão para serem
tunados na Garagem."
(Cena no
auditório, cadeiras
do final da sala do
lado direito – o
Ensaísta noutra
cadeira, numa
fileira de trás,
tendo um colega de
concurso com quem
conversa. À sua
direita, por trás do
rosto do colega que
olha o palco, o
Ensaísta sorri por
mais tempo que o que
seria adequado em
direção a um lindo
sorriso de uma jovem
ao final da fileira,
como que saída de um
Godard preto e
branco dos sessenta,
tipo
Acossado
ou
Bande à
part. Em
off, seus
pensamentos, depois
que o amigo, pouco
tempo depois,
levanta e sai, a
garota não mais lá)
"Daqui a um quarto
de século, o mesmo
tempo de um quarto
de século que eu e
Ricardo cá estamos,
tudo correndo bem
essa moça ainda
estará cá no Banco.
Eu, Paulo e Ricardo,
na cúspide dos
octagenários, no
máximo passando por
cá para resolver
pendências na FAPES
– ou tomar vacinas.
Cada um no seu
caminho. Ricardo
acredito que tendo
trilhado
bem-sucedida
continuidade de
carreira, não mais
pública, mas sob as
bênçãos auspiciosas
de bem-fazejo
capital. Eu tendo
mergulhado
finalmente em
Parfit e
Proust,
Musil
e
Wallace,
Bascom e
Jodorowsky,
tomos grossos que me
esperam em seus
plásticos, bem como
umas outras centenas
mais finos."
"Sorrentinamente,
sorrio. Sorrio, como
Marcello ao final
de La Dolce Vita,
numa comunicação sem
sentido, em meio à
zona que alvorece,
com a leveza que
está fora dessa
vertigem, do meu
conjunto de
perplexos PUCs
derradeiros, dos
momentos no tempo de
nossas histórias.
Sorrio, como
a
mocinha ao final de
12 Macacos,
ao mesmo tempo vendo
a zona que rola no
presente, ao mesmo
tempo vendo o mais
grave do futuro,
esperança e
disparate. Essa
menina quando
aposentada da FAPES
envelhecerá sob o
Jackpot
gibsoniano a
plena carga enquanto
nós seremos
lágrimas na chuva.
E essa reformulação
será então um curto
momento na história
dessa moça, momento
apagado ante às
mudanças mais
profundas que Banco
e país passarão em
2019. E em um quarto
de século isto será
uma nota de rodapé
esquecida, os "Look
on my Works, ye
Mighty, and despair!"
de Rabello e de
Ricardo tão obscuros
na memória quanto
Gros, seus piscinões,
seu Efeito
Multiplicador do
Desembolso."
(música volta a
subir: "And
you’re the best girl
I ever had / Can’t
remember anything at
all")
"abrace essa
cantiga por onde
passar" |
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Opinião |
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CHARGE/NELSON
TUCCI |
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COLABORAÇÕES |
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