Uma proposta para a TLP
 

Thiago Rabelo Pereira e Marcelo Miterhof
Thiago é economista licenciado do BNDES. Marcelo é economista do BNDES
 

Está em debate no Congresso Nacional a MP 777 que pretende substituir a TJLP (taxa de juros de longo prazo), definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), pela TLP (taxa de longo prazo), que seria igual à NTN-B de cinco anos, um título público indexado ao IPCA ao qual se soma uma parcela de taxa de juros fixa.

Seus defensores alegam que o fim da TJLP dará mais potência à política monetária, o que reduziria os juros para todos os créditos. Acabaria também com o custo fiscal de atuação do BNDES, referente à diferença entre a taxa que o BC paga para captar recursos (Selic) e a que emprestou recursos ao Banco (TJLP). E que a TLP será mais previsível, pois referenciada a mercado em vez de arbitrada.

Quanto à política monetária, a tese é que como uma parte da demanda agregada, o investimento financiado pelo BNDES, não é afetada por variações da Selic, são necessários juros mais altos para controlar a inflação. Só que o BNDES responde por menos de 3% do fluxo de crédito concedido no país!

Não é a TJLP que faz a Selic ser alta. Ao contrário, foi a persistência do juro alto que exigiu, quando do lançamento do Plano Real, a criação da TJLP como custo financeiro em moeda local do crédito de longo prazo para o investimento.

Tal prioridade ao investimento não é uma veleidade e foi reconhecida pelos autores do Plano Real. Ele é uma variável-chave na economia, que, hoje, gera emprego e renda, e, amanhã, eleva a produtividade e a capacidade produtiva, permitindo crescer mais sob baixa inflação.

É fundamental lembrar que já cabe à equipe econômica fixar tanto a Selic quanto a TJLP, podendo igualá-las. A MP tira flexibilidade da gestão econômica, pois a decisão sobre o nível adequado de cada taxa depende das condições da conjuntura, como o nível de atividade e os impactos fiscais de ambas as taxas.

Os defensores da proposta querem fazer crer que a ausência do BNDES propiciará por geração espontânea o florescimento de mercados de créditos e de capitais profundos e maduros, o que desafia o bom senso e a experiência histórica. A Selic alta é o principal entrave a esse florescimento. A convergência entre TJLP e Selic é evidentemente desejável, mas pela queda da segunda, não a subida da primeira.

Quanto à necessidade de dar maior previsibilidade ao custo financeiro do BNDES, bastaria mudar a TJLP de taxa variável para fixa na data de contratação.

Indexar diretamente a mercado o custo do investimento é hoje deletério. Os detentores de ativos financeiros têm um custo de oportunidade imbatível: juro alto, de prazo curtíssimo (1 dia), em geral pós-fixados e com a segurança de títulos públicos. Assim, a demanda por títulos de prazos mais longos e prefixados, como a NTN-B de cinco anos, é menos relevante, o que torna seu preço mais volátil, além de procíclico (o juro sobe na recessão e cai na euforia do crescimento).

Mais razoável, é ajustar o papel do BNDES, com foco progressivo nas atividades intensivas em externalidades (benefícios sociais não capturados nos preços privados, como a inovação de um setor que é usada por outro). Na medida em que a atividade econômica se recupere, a Selic caia e as fontes privadas se mostrem aptas a assumir novos protagonismos no financiamento ao investimento em condições aceitáveis de custo, prazo e volume, o BNDES poderá ter um papel diferente, ainda que não necessariamente menos relevante.

Para tanto, uma proposta é manter a formatação da TLP, apontando a perspectiva de alinhar o custo do funding do BNDES ao mercado, mas conferindo ao CMN a prerrogativa (não a obrigação) de aplicar redutores. Conforme as necessidades da economia e a avaliação do espaço fiscal, seria possível:

i) filtrar a volatilidade excessiva da NTN-B de cinco anos, evitando sua transmissão automática ao custo do investimento;

ii) conceder um incentivo geral ao investimento, em especial em momentos de grande capacidade ociosa;

iii) proporcionar a setores e atividades intensivos em externalidades uma redução focalizada do custo de financiamento, de forma a alinhar o retorno privado ao retorno social dos projetos.

Sem esse pragmatismo, a TLP pode amarrar as mãos da equipe econômica e tornar ainda mais difícil a retomada do crescimento sustentado.

 
 
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