|
|
|
|
|
Algumas controvérsias a respeito da
MP 777 |
|
|
|
|
|
|
Vice-presidente da AFBNDES |
|
|
|
|
|
Introdução
Para quem acompanhou as
duas primeiras
audiências públicas da
Comissão Mista instalada
pelo Congresso Nacional
para analisar a Medida
Provisória 777/2017, é
realmente engraçado
ouvir dos defensores da
TLP que o que está em
discussão não é o BNDES.
As apresentações de
representantes de órgãos
do governo têm sido mais
duras em relação ao
Banco do que a de
economistas convidados
pelos defensores da MP.
A minha visão sobre a
qualidade do que vem
sendo dito ficará clara
no que segue.
Só os absolutamente
desavisados deveriam
ignorar que o que está
em marcha é um projeto
de gradual desmonte do
BNDES. Como cansamos de
alertar aos
funcionários, o projeto
ora em marcha foi
desenhado há mais de dez
anos. Não há inovações
significativas, seja de
argumentos, seja de
propostas na atual MP em
relação ao que propôs
Persio Arida em junho de
2004. Apenas optou-se
por um gradualismo. Não
se fala em leilões do
FAT ou em zerar a
alíquota do PIS. Claro,
por enquanto.
Após as duas primeiras
audiências tivemos
acesso finalmente a
algumas respostas e
argumentos ainda não
apresentados pelos
defensores da TLP. A
seguir, revisa-se alguns
desses argumentos.
Nenhum
instrumento de política
de desenvolvimento a
menos!
Na audiência da última
segunda-feira (24),
chegou-se a argumentar
que precisávamos ser
menos resistentes a
mudança porque o caminho
que temos trilhado no
Brasil não tem sido de
desenvolvimento. A
produtividade está
estagnada etc. etc. etc.
Por que então não
examinar com mais
carinho a proposta da
TLP?
Em primeiro lugar,
porque o que estamos
presenciando ao longo
das últimas três décadas
é a adoção de reformas
liberais sempre com
promessas de que basta
nos livramos do nosso
passado institucional
intervencionista para
que o mercado e com ele
os corretos incentivos
nos guiem para o rumo da
prosperidade. O BNDES é
praticamente o último
instrumento relevante de
intervenção estatal para
promoção do
desenvolvimento que
restou e agora dizem que
é exatamente a
existência do BNDES que
está no caminho da
reconciliação do país
com o desenvolvimento.
Do nosso ponto de vista,
a TLP deve ser rechaçada
exatamente porque ela
significa mais um passo
nessa história de
desmonte.
Não temos compromisso
com o atual arranjo
FAT-TJLP. A questão é
que a MP reduz o poder
de influência do BNDES
sem colocar nada no
lugar. Seu significado é
exatamente esse:
esvaziar mais um
instrumento de promoção
do desenvolvimento no
país.
A
genialidade da MP 777
Segundo o ministro do
Planejamento, Dyogo
Oliveira, a genialidade
da MP 777 está no fato
de o BNDES poder
securitizar o projeto
financiado e, com isso,
renovar o seu funding
(Valor Econômico,
11/07/2017). Um dos
escândalos da MP é que
seus principais méritos,
do ponto de vista dos
seus defensores menos
técnicos – afinal de
contas, quem compra a
bobagem da história do
aumento da eficácia da
política monetária, além
dos técnicos do Banco
Central, da Fazenda e os
economistas que os
defendem –, dispensam
sua existência. À
pergunta: a MP é
necessária para que o
BNDES possa securitizar
parte dos seus ativos
creditícios? A única e
simples resposta é NÃO.
A qualquer momento o
BNDES pode criar
produtos à taxa de
mercado e vender os
ativos assim gerados.
Não há nada na MP que
torne isso possível. Se
fizesse isso, algumas
questões poderiam ser
testadas para ver o quão
genial é a proposta de
securitização. Os
financiamentos
conseguiriam demanda? O
mercado teria apetite
por esses ativos? O
BNDES teria realmente
algum benefício com
essas operações? Isso
para não entrarmos na
discussão se cabe a um
banco de desenvolvimento
vender ativos
creditícios de apoio a
setores estratégicos.
Volatilidade da TLP
Dois argumentos podem
ser dados para mostrar
que a nova taxa de juros
será mais volátil. Em
primeiro lugar, deve-se
apreciar o histórico da
TLP – se ela existisse
no passado comparada com
a TJLP. A taxa é bem
mais alta e muito mais
volátil. Os interessados
em acompanhar o debate
podem constatar que os
defensores da MP nunca
apresentam esse gráfico
histórico. Em segundo
lugar, o reconhecimento
da volatilidade foi
feito pela declaração do
ministro da Fazenda,
Henrique Meirelles, de
que "o governo teve o
cuidado de estabelecer
na MP 777 que a fixação
da TLP será com base em
uma média de três meses
da NTN-B" (11/07/2017).
Essa afirmação não
corresponde aos fatos.
Não há previsão na MP
para uma média de três
meses das NTN-B. O que
mostra que o ministro
desconhece o teor da
medida. Além disso, tal
proposta nunca foi
apresentada pelos
técnicos envolvidos na
discussão. Feita no
contexto do processo de
"convencimento" do
presidente do BNDES, a
afirmação desnuda o
contrário do que afirma:
a falta de cuidado da
equipe econômica.
Na sua apresentação,
Armando Castelar
contesta que a TLP seja
mais volátil que a TJLP.
Argumentou que uma vez
contratado o
financiamento, a TLP é
fixa do ponto de vista
real. O que Castelar não
considera é que a
volatilidade é uma
questão também para quem
está considerando tomar
o crédito. É desse ponto
de vista que falamos,
assim como falou
implicitamente o
ministro Meirelles, de
volatilidade da TLP.
Eficácia
da política monetária
Como a audiência de
segunda-feira confirmou,
um dos principais
argumentos em defesa da
MP 777 é que haveria um
aumento no poder ou
eficácia da política
monetária. Isso quer
dizer que os efeitos das
variações da taxa de
juros se fariam sentir
de forma mais efetiva
sobre a taxa de
inflação, com a
implicação de que para
combater a inflação o
Banco Central poderia
aumentar menos, do que
costuma fazer, a taxa de
juros. Ou seja, o nível
da taxa de juros no
Brasil poderia ser menor
do que é hoje.
Por que a eficácia
aumentaria com a TLP?
Porque a TLP, ao
contrário da TJLP, é
sensível à Selic, a taxa
de juros fixada pelo
Banco Central. Uma
questão importante
também é apurar o quanto
significativo seria o
bloqueio que a TJLP
causaria para a
transmissão da
influência da Selic
sobre a economia. Os
defensores da MP 777
frequentemente usam o
fato de que o "crédito
direcionado" é uma
parcela muito
significativa do total
do estoque de crédito da
economia. Por exemplo,
na exposição de motivos
da MP 777, encontramos:
"No sistema atual, parte
relevante do estoque de
crédito não é afetado
pelas decisões de
política monetária, que
ocorrem no âmbito do
Comitê de Política
Monetária do Banco
Central (Copom). Assim,
para que os efeitos do
aumento da taxa Selic
sejam sentidos no
controle da inflação, é
necessária uma elevação
maior desta taxa, uma
vez que parte do crédito
não é afetada por essa
decisão. Esse
overshooting tem
impacto no financiamento
da dívida pública e nos
empréstimos tomados
pelas pessoas físicas e
jurídicas ao longo de
cada ciclo de alta dos
juros".
Em resposta a essa
posição, economistas e
representantes da
indústria contrários à
MP 777 têm defendido que
o que é relevante para
avaliar o quanto a TJLP
entupiria o mecanismo de
transmissão da política
monetária não é o
estoque de crédito, mas
o fluxo de novo crédito
dirigido. O argumento é
que o que importa são as
decisões de consumo e
investimento, ou demanda
agregada, que são a cada
momento influenciadas
pela taxa de juros. Até
a primeira audiência da
Comissão da MP 777,
realizada em Brasília no
dia 12 de julho, os
defensores da TLP
evitaram o tema. Uma
atitude sistemática da
parte deles. Sabem que
são maioria, que têm
mais acesso de mídia e
preferem ignorar
obje-ções e argumentos
ao que defendem. Em
Brasília, entretanto,
instados pelo relator, o
deputado Betinho Gomes,
tive-ram que responder
ao tema. A resposta é
desconcertante, pois
mostra um desalinhamento
com a exposição de
motivos da MP. Segundo
Tiago Berriel, do Banco
Central:
"Do ponto de vista do
poder da política
monetária, o mais
importante é influenciar
as decisões dos agentes,
as taxas esperadas, as
taxas futuras… Nesse
sentido é muito mais que
só o fluxo… A política
monetária influencia a
decisão de tomar
empréstimo e a decisão
de não tomar também. Tem
que influenciar as
decisões de consumo e
investimento de curto,
médio e longo prazos.
Hoje em dia a política
monetária não afeta as
decisões de investimento
de médio e longo prazos.
A questão não é
meramente olhar a
estatística de fluxo ou
de estoque. A política
monetária pode ter
efeito via estoque…, mas
isso não precisa ser
trazido à discussão
porque a TLP não vai
afetar o estoque já
desembolsado pelo
BNDES". |
|
|
BNDES:
Desembolsos
para
Indústria
Comércio
e
Serviços |
|
|
|
|
|
|
A questão se resume ao
seguinte: a Selic é mais
alta do que deveria ser
porque não influencia as
decisões de investimento
de médio e longo prazos,
ou seja, o problema está
em que o investimento
não cai como deveria
cair toda vez que a taxa
de juros sobe. Essa é a
questão da eficácia na
visão dos defensores da
MP. Eles deveriam deixar
isso mais claro, mas se
escondem nesses
argumentos do tamanho do
crédito direcionado.
Mais um exemplo de
transparência dos
defensores da TLP. A
questão é: o quão
desejável é tornar o
investimento mais
sensível à taxa de
juros? Principalmente
quando vemos a
quantidade de fatores
exógenos, choques de
preço por conta de
fenômenos climáticos,
crises internacionais
etc., a que nossa
economia está sujeita e
o quanto isso leva a
reações da taxa de juros
numa estrutura de
política monetária
comprometida apenas com
a estabilidade dos
preços.
De fato, o que a TJLP
permitiu ao longo dos
anos foi proteger os
investimentos dessa
volatilidade para
permitir ao país ao
menos continuar
caminhando. Inverte-se
uma conexão causal clara
– com uma taxa de curto
prazo historicamente tão
alta, não há mercado de
longo prazo – por uma
extremamente duvidosa,
de que essa taxa de
curto prazo é muito alta
porque a taxa de longo é
administrada.
O que é ignorado nessa
discussão é que se o
ponto é coordenar a taxa
de longo prazo com a de
curto, o atual arranjo
institucional permite
que a TJLP seja fixada
no nível desejado pelas
autoridades econômicas.
Talvez ainda mais
importante é discutir se
o canal de transmissão
da política monetária no
Brasil, particularmente
numa situação de
recessão como a atual, é
mesmo via demanda
agregada. Vários
analistas de mercado e
acadêmicos acreditam que
a taxa de juros do Banco
Central afeta a taxa de
inflação por meio de seu
efeito sobre a taxa de
câmbio. Se esse for o
principal mecanismo de
transmissão, o BNDES não
joga nenhum papel na
redução da eficácia da
política mone-tária e a
TLP é uma futilidade do
ponto de vista de
combate à inflação e, ao
mesmo tempo, um desastre
do ponto de vis-ta do
desenvolvimento.
MPME
Na primeira audiência em
Brasília, no dia 12 de
julho, com grande alarde
foi mostrado pela
Fazenda um "gráfico de
pizza" que causou
impacto no momento da
sua exibição e,
posteriormente, alguma
repercussão pelas mídias
sociais. Nesse gráfico,
como uma evidência de
que o BNDES apoia
empresas escolhidas, ao
contrário do que faz o
mercado, mostrava-se a
distribuição dos
financiamentos do BNDES
e do Bradesco
decompostos por porte de
empresas, grandes,
médias, pequenas e
microempresas. Enquanto
a carteira do Bradesco
contava com participação
de 36% de grandes
empresas, a do BNDES
contava com 80%. Os
dados são do Banco
Central de março de
2017.
Os dados pareciam
confirmar não só o
comentário de difamação
das redes sociais de que
o BNDES apoia "os amigos
do rei", argumento que
tem sido reproduzido até
por figuras outrora
intelectualmente
respeitáveis, mas também
reforçava a linha de
argumentação principal
da apresentação do
Ministério da Fazenda de
que o principal
propósito da MP 777 é
defender os
trabalhadores. Uma maior
participação do setor
privado no mercado de
crédito levaria a uma
"democratização" do
crédito no Brasil.
Democratizar o crédito
só poderia ter algum
significado se os bancos
privados conseguissem
fazer operações
semelhantes às do BNDES,
alcançando empresas de
menor porte. Caso
contrário deveríamos
colocar na comparação
outras "instituições".
Não há dúvida que
agiotas emprestam para
indivíduos de menor
nível de renda que os
bancos comerciais. Seria
esse o modelo de negócio
que deveríamos emular? A
primeira críti-ca ao
"gráfico de pizza" é que
ele, ao comparar a
carteira do BNDES e do
Bradesco, não está
levando em conta que
está comparando laranja
com maçãs. Por exemplo,
quanto o Bradesco apoia
de infraestrutura e
exportação?
Como essa decomposição
por atividades não é
possível com os dados de
estoque do Banco
Central, examinamos o
que indicam os
desembolsos do BNDES ao
longo do tempo.
Excluindo as operações
de exportação e
infraestrutura que pela
característica
estrutural da atividade
tendem a ser dominadas
quase que exclusivamente
por grandes empresas, os
desembolsos do BNDES de
2011 a 2016 mostram uma
divisão entre grandes e
as demais que está na
casa dos 50%.
Uma outra diferença
crucial que o famigerado
"gráfico de pizza" não
considera é que a função
por excelência do BNDES
e a dos bancos
comerciais são
diferentes. Apoiar
capital de giro seria
função dos bancos
comerciais. Os dados de
estoque indicam que os
bancos comerciais
praticamente não apoiam
empréstimos de mais de 5
anos de maturidade,
enquanto que metade dos
empréstimos do BNDES são
de pelo menos 5 anos. De
fato, considerando os
demais bancos públicos,
pode-se constatar que
apenas 11% dos
financiamentos para
empréstimos de mais de 5
anos são feitos por
bancos privados
nacionais e
internacionais. E isso
não é tudo. Como
veremos, essa
estatística ainda
superestima o papel
desses bancos nesse
setor.
A segunda crítica que se
deve fazer é que as
operações no Banco
Central estão
registradas de forma que
os financiamentos que os
bancos comerciais fazem
de repasse do BNDES
estão contabilizados
como seus e não como do
BNDES. Ou seja, o
polêmico "gráfico de
pizza" só cobre as
operações diretas do
BNDES e inclui nas
carteiras dos bancos
comerciais as operações
indiretas. Logo os 11%
de financiamento a
empréstimos de mais de 5
anos dos bancos privados
são em grande medida
parte do apoio realizado
com funding do
BNDES. Como todo mundo
que trabalha no BNDES
sabe, e como todo mundo
que está na Fazenda
deveria saber, as
operações indiretas são
cerca de metade do valor
das operações do BNDES
e, com destaque para o
Finame, tendem a atender
empresas de menor porte.
Esse é um outro fator
que explica o número
mágico de 80%.
Assim o gráfico mostra o
BNDES com uma carteira
de 333 bilhões, a do
Bradesco de 169 bi. Os
repasses do BNDES
correspondem a 262,8
bilhões. Desses
recursos, para o
Bradesco foram
repassa-dos 32 bilhões
(ou seja, 16% da
carteira do Bradesco);
para o Itaú, 27,6
bilhões.
Mas se os analistas do
Ministério da Fazenda
não deram desconto para
as atividades especiais
do BNDES, isso não quer
dizer que não tenham
sido generosos com a
análise da carteira do
Bradesco. A terceira
crítica que pode ser
feita ao gráfico é que
da carteira do Bradesco
foram excluídos os
créditos a pessoas
jurídicas no exterior!
Para quem são esses
créditos? Dificilmente
para MPMEs. E esses
empréstimos a PJs no
exterior são 33% da
carteira do Bradesco. A
correta apresentação do
gráfico da carteira do
Bradesco indicaria que
59% do seu crédito é
destinado a grandes
empresas. Um número que
poderia ser ainda maior
se excluirmos os 32
bilhões de repasses do
BNDES. Assumindo o caso
limite de que os 32
bilhões dos repasses
foram para MPMEs,
teríamos o seguinte
cenário para a carteira
do Bradesco completa:
dois terços para grandes
empresas e um terço para
MPMEs.
Note-se ainda que esses
números não levam em
conta o apoio na forma
de garantias do BNDES
via FGI, em geral
voltado para bancos
privados…
O apoio direto a MPME é
o resultado de inovações
do BNDES. Isso foi
possível porque vários
produtos foram
desenvolvidos no Banco,
como o Cartão BNDES. O
apoio do BNDES direto
para MPMEs é uma
resposta a uma demanda
pública, mas ele está
longe de esgotar a
importância da atuação
do Banco para MPMEs.
Grandes empresas são
mercados para MPMEs.
Para dar um exemplo
clássico, a
industrialização
brasileira sofreu enorme
impulso, nos anos 50,
apoiando multinacionais,
montadoras de
automóveis, mas esse
apoio foi condicionado à
obrigação dessas
multinacionais de
comprarem produtos de
empresas nacionais de
autopeças, à época muito
incipientes.
Há muito o que se
discutir sobre o apoio
do BNDES nesse setor e
essa discussão é
bem-vinda e necessária.
O problema é que, como
mostra a discussão sobre
a MP 777, ela está
interditada pelo domínio
de um debate ideológico
de baixo nível que
sugere que quem apoia a
MPME, de verdade, é o
sistema privado
financeiro e não as
agências públicas
financeiras. Coisa de
gente que não sabe o que
está falando, ou está
disposta a falar
qualquer coisa para
atacar o BNDES e fazer
com que a MP 777 seja
aprovada. |
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
COLABORAÇÕES |
|
|
|
Colaborações
podem ser enviadas para a redação
do VÍNCULO - Av. República do
Chile 100, sobreloja/ mezanino,
Centro, Rio de Janeiro, RJ, CEP
20139-900 - ou através do e-mail
vinculo@afbndes.org.br.
Lembramos que as opiniões
emitidas nos artigos assinados são
de inteira responsabilidade de seus
autores. |
|
|
|
|