Breve histórico
Desde 1999, o dinheiro
que os trabalhadores têm
no Fundo de Garantia é
corrigido com base na TR
(Taxa Referencial). Com
isso, o rendimento é
menor que o da poupança
e, muitas vezes, não
cobre nem a inflação.
Segundo especialistas,
nos anos 1990, quando a
Selic (taxa básica de
juros) encontrava-se em
um patamar elevado, o
cálculo da TR resultava
em um índice bem próximo
ao da inflação mensal,
de forma que a correção
por meio deste índice
era plenamente capaz de
garantir a correta
atualização monetária e
a consequente manutenção
do poder aquisitivo da
moeda.
Entretanto, diante das
mudanças financeiras do
país, houve uma redução
da taxa de juros,
impactando diretamente
sobre o cálculo da TR,
que não conseguiu mais
acompanhar o poder de
compra da moeda.
Caso o trabalhador
pudesse colocar esse
dinheiro em outras
aplicações, teria um
retorno maior. Na
prática, quem tem
recursos no FGTS está
perdendo dinheiro. A
substituição da TR pelo
IPCA-E tem sido a
proposta considerada
mais benéfica à correção
porque reflete a real
inflação do país.
Do prazo prescricional
Por mais de vinte anos,
a jurisprudência pátria
afirmou que o prazo
prescricional aplicável
ao FGTS seria o
trintenário e não o
quinquenário, previsto
no art. 174 do Código
Tributário Nacional (CTN).
Esse entendimento foi
fixado nas Súmulas
362/TST e 210/STJ, tendo
como fundamento os arts.
23, § 5º da Lei
8.036/90, e 55 do Dec.
99.684/90.
Porém, em novembro de
2014, no ARExt
709212/DF, o Plenário do
Supremo Tribunal Federal
(STF) discutiu novamente
a questão do prazo
prescricional aplicável
para a cobrança das
contribuições ao FGTS
não depositadas
tempestivamente pelos
empregadores e tomadores
de serviço.
Nesta ocasião, o Pleno
do STF reviu sua
jurisprudência e decidiu
que o prazo
prescricional aplicável
às cobranças dos
depósitos do FGTS é o de
5 anos, previsto no art.
7º, inc. XXIX, da CF/88,
pois trata-se de direito
dos trabalhadores
urbanos e rurais, nos
termos do inciso III do
referido dispositivo
constitucional. Com
isso, ficam superadas as
Súmulas 362/TST e
210/STJ.
O Plenário do STF, tendo
em conta a mudança
jurisprudencial operada,
destacou a necessidade
de garantia da segurança
jurídica. Assim, com
fundamento no art. 27 da
Lei n. 9.868/99, o STF
atribuiu efeitos ex
nunc – ou seja,
prospectivos – ao
julgamento do ARE
709212/DF.
Desse modo, conforme
explicou o ilustre
Ministro Gilmar Mendes:
"(...) para aqueles
[casos] cujo termo
inicial da prescrição
ocorra após a data do
presente julgamento,
aplica-se, desde logo, o
prazo de cinco anos. Por
outro lado, para os
casos em que o prazo
prescricional já esteja
em curso, aplica-se o
que ocorrer primeiro: 30
anos, contados do termo
inicial, ou 5 anos, a
partir desta decisão.
Assim se, na presente
data, já tenham
transcorrido 27 anos do
prazo prescricional,
bastarão mais 3 anos
para que se opere a
prescrição, com base na
jurisprudência desta
Corte até então vigente.
Por outro lado, se na
data desta decisão
tiverem decorridos 23
anos do prazo
prescricional, ao caso
se aplicará o novo prazo
de 5 anos, a contar da
data do presente
julgamento".
O problema é só um. Se o
STF assim declarou,
teria isso impacto em
uma ação revisional de
FGTS contra a CEF?
Entendemos que sim, pois
somente a partir
de 13.11.2014 é que
começa a contar o prazo
geral de prescrição que
consta do art. 205 do
Código Civil:
Art. 205. A prescrição
ocorre em dez anos,
quando a lei não lhe
haja fixado prazo menor.
Então, ao contrário do
que se comunga por aí,
se alguém resolver
entrar com ação, a
prescrição da parcela a
ser buscada só se inicia
a partir de 2024.
Da inconstitucionalidade
da TR
Seria então a manutenção
deste índice algo
inconstitucional?
Dita a Constituição:
Art. 7º São direitos dos
trabalhadores urbanos e
rurais, além de outros
que visem à melhoria de
sua condição social:
...
III - fundo de garantia
do tempo de serviço;
Se entende pacificamente
que as normas veiculadas
no artigo em comento
traduzem uma garantia.
No momento em que a
Constituição fala em
melhoria da condição
social, como seria
possível você impor a um
cidadão que ele faça um
investimento para
perder dinheiro?
A cada ano, o total
acumulado é corrigido
por uma taxa fixa: de 3%
mais o valor da TR (Taxa
Referencial), que varia
diariamente. O problema
é que o valor da TR é
baixo. Em 2017, ela
acumulou 0,6% em um ano,
segundo o Banco Central.
Com isso, o reajuste de
quem tem dinheiro no
FGTS foi de 3,6% no ano
passado. É bem menos do
que o rendimento da
poupança, que foi de
6,2% em 2017 – e a
poupança é uma das
opções de investimento
com ganho mais baixo.
Além disso, são raros os
anos em que o reajuste
do FGTS supera a
inflação. Isso
significa, na prática,
que o dinheiro que o
trabalhador tem guardado
ali está diminuindo.
Entre 2007 e 2017, por
exemplo, o dinheiro
aplicado no FGTS rendeu
49,7%, enquanto a
inflação avançou 82,6%.
Um trabalhador que tinha
R$ 10 mil no FGTS em
2007 chegou a 2017 com
R$ 14.967 em conta, mas
o preço dos produtos e
serviços subiu mais que
isso nesse período.
Então, houve uma perda
no poder de compra do
trabalhador.
Dissenso dos tribunais
superiores
O problema se agrava
porque ainda não existe
um posicionamento
definitivo com relação
ao índice a ser adotado
para atualização dos
créditos trabalhistas,
ou seja, se deve ser
aplicado o Índice de
Preços ao Consumidor
Amplo Especial (IPCA-E)
ou a Taxa Referencial
(TR).
Num passado recente, o
STF julgou as ADIns 4357
e 4425, referentes à EC
62/09, que instituiu o
regime de pagamento de
precatórios de órgãos
públicos federais,
estaduais e municipais.
Na ocasião, restou
decidido que a correção
monetária dos
precatórios seria feita
pelo IPCA-E, ao
fundamento de que a TR
não preservaria o valor
real da moeda e, por
isso, não protegeria o
direito adquirido.
Por sua vez, o STJ
(Superior Tribunal de
Justiça) decidiu em 2018
que o rendimento do FGTS
deve ser mantido como
está! No fatídico
11/04/2018, a 1ª Seção
do Superior Tribunal de
Justiça decidiu, em
julgamento de recurso
repetitivo, que será
mantida a Taxa
Referencial de juros
(TR) como índice de
atualização do FGTS.
Por unanimidade, o
colegiado julgou
improcedente o recurso
que pedia a alteração na
forma de correção do
Fundo, determinando a
correção pelo Índice
Nacional de Preços ao
Consumidor (INPC).
Segundo o STJ, mais de
409 mil ações aguardavam
a conclusão desse
julgamento.
O colegiado estabeleceu
a tese de que a
remuneração das contas
vinculadas ao FGTS tem
disciplina própria,
ditada por lei, que
estabelece a TR como
forma de atualização
monetária, sendo vedado,
portanto, ao Poder
Judiciário substituir o
índice. A tese firmada
em recurso repetitivo
tem orientado desde
então todos os processos
com objeto semelhante
que tramitam nas
instâncias ordinárias em
todo o território
nacional.
Mas o STJ poderia ter
feito isso?
Retomando o dito
alhures, o STF julgou as
ADIns 4357 e 4425,
referentes à EC 62/09,
que instituiu o regime
de pagamento de
precatórios de órgãos
públicos federais,
estaduais e municipais e
reconheceu a
inconstitucionalidade da
TR ao fundamento de que
a mesma não preservaria
o valor real da moeda e,
por isso, não protegeria
o direito adquirido, e
ainda indicou que o
IPCA-e é o melhor
indexador para ser
utilizado na correção
monetária das ações
propostas contra a
Fazenda Pública.
A conclusão desse
julgamento foi
unânime.
Então, percebam, o STF
disse que a TR não serve
para correção monetária.
Posteriormente, alguns
recursos chegaram ao STF
tratando da temática da
troca de índice de TR
para IPCA-E e a Suprema
Corte simplesmente
negava análise desses
recursos afirmando que
não caberia a ela
discuti-los, pois
tratavam de matéria
infraconstitucional.
Outros recursos chegaram
a ser julgados pelo
tribunal, mas não
tratavam exatamente do
tema em debate, como o
Recurso Extraordinário
nº 611503, por exemplo.
A aplicação do parágrafo
único do artigo 741 do
antigo Código de
Processo Civil foi o
centro do julgamento. O
dispositivo afirma que é
"inexigível o título
judicial fundado em lei
ou ato normativo
declarado
inconstitucional pelo
Supremo Tribunal
Federal" ou fundado em
aplicação ou
interpretação
considerada incompatível
com a Constituição
Federal.
Porém, a questão de
fundo do recurso era
meramente processual. O
que quer dizer que isso
ainda não transitou em
julgado e o tema está
completamente aberto, ao
menos no STF.
Conclusão
Podemos dizer que uma
ação de revisão de FGTS
objetivando a troca de
índices seria viável,
sim! Mas essa ação vai
ter um caminho bem
tortuoso a percorrer.
Torcemos que a harmonia
necessária da segurança
jurídica prevaleça. |