Até o início da
noite de ontem (22),
a diretora de
Governo e
Infraestrutura do
BNDES, Karla
Bertocco, não havia
recebido a AFBNDES
para tratar do caso
do afastamento da
chefe do
Departamento de Meio
Ambiente, Daniela
Baccas, após
críticas sem
fundamento do
ministro do Meio
Ambiente, Ricardo
Salles, à gestão do
Fundo Amazônia (a
reunião foi pedida
na sexta-feira, 17).
Também não era
pública qualquer
palavra do
presidente Joaquim
Levy a respeito.
E isto depois do ato
de desagravo a
Daniela, que levou
centenas de
empregados ao térreo
do Edserj na tarde
da última
segunda-feira (20);
do pedido de
renúncia do
superintendente
Gabriel Visconti, da
Área de Gestão
Pública e
Socioambiental, em
solidariedade à
colega; e da grande
repercussão do
assunto na mídia,
com reportagem de
mais de quatro
minutos no Jornal
Nacional de
anteontem e matérias
em diversos veículos
de comunicação do
país e até mesmo no
New York Times. Quer
dizer que o corpo
funcional e a
comunidade benedense
terão que ficar
satisfeitos com a
nota divulgada pelo
Banco quando houve o
afastamento da chefe
de departamento após
pressão do MMA?
A AFBNDES deixou
patente na manhã de
segunda-feira seu
descontentamento com
o teor do comunicado
do Banco: "O mais
grave da nota é
tentar passar como
natural o que é uma
excepcionalidade.
Não é verdade que a
decisão do afastamento ‘reflete
prática natural
enquanto se
esclarecem as
questões
levantadas’. Ao
contrário, ao menos
no BNDES tal decisão
não conhece
precedente, haja
vista que até
hoje comissões de
apuração interna
foram abertas
sem o afastamento
dos
investigados. Também depõe
contra a suposta
normalidade do
procedimento a
própria situação do
presidente do
Banco, que é
investigado
pelo Tribunal de
Constas da União
(TCU), assim
como a do ministro
do Meio
Ambiente, que está
sob investigação
criminal, além de já
ter sido condenado
em primeira
instância por
improbidade
administrativa. Note-se
que o caso da chefe
do Departamento de
Meio Ambiente não é
comparável a
qualquer um dos
citados, uma vez que
o afastamento ocorre
antes de iniciada
qualquer investigação,
como esclarece a
própria nota da
diretoria do BNDES".
Ato grave e
intolerável –
Durante a
manifestação de
desagravo de
segunda-feira, os
empregados
explicitaram sua
indignação com o ato
grave e intolerável
do MMA contra o
Fundo Amazônia, a
governança do BNDES
e o corpo técnico da
instituição, na
figura de Daniela.
"Nem na época da
ditatura isto
aconteceu aqui",
contou o colega
aposentado Paulo
Sérgio Moreira da
Fonseca no final da
concentração. "Há
pessoas sendo
investigadas no
BNDES por comissões
internas, nenhuma
delas foi afastada.
O clima é de
surpresa, é de
sentir que você não
pode cumprir seu
trabalho técnico de
forma independente,
e isso é a razão, a
natureza do nosso
trabalho", afirmou o
vice-presidente da
AFBNDES, Arthur
Koblitz, em
entrevista ao Jornal
Nacional na
terça-feira.
O posicionamento dos
empregados no térreo
do Edserj foi ouvido
alto e bom som. Eles
querem que a
Diretoria do Banco
se retrate e volte
atrás da decisão de
afastamento da chefe
de departamento e,
em votação unânime,
aprovaram moção
exortando os colegas
para que não aceitem
o cargo em questão.
Também ficou
decidida a
realização de um ato
unificado, na
próxima semana, em
defesa do Fundo
Amazônia, reunindo
entidades e
trabalhadores do
setor de meio
ambiente. Na
segunda-feira,
representantes da
Associação dos
Servidores do Ibama
(Asibama-RJ) e do
Sindicato dos
Petroleiros do Rio
de Janeiro
acompanharam o
protesto dos
empregados do Banco.
O presidente da
AFBNDES, Thiago
Mitidieri, não
esteve presente por
motivo de doença.
As "razões" do
ministro para fazer
pressão sobre o
Fundo Amazônia –
apesar da
Controladoria Geral
da União (CGU) e do
Tribunal de Contas
da União (TCU) não
terem constatado
nenhuma
irregularidade na
sua gestão – foram
contestadas pela
AFBNDES, em nota, e
pelos empregados no
térreo do Edserj em
sucessivas falações.
"Tão grave
quanto o afastamento
foi o motivo que
levou a diretoria a
afirmar a
possibilidade de
abertura da
investigação. A
decisão é, segundo a
nota do BNDES,
baseada em alegações
do ministro do Meio
Ambiente sobre
supostas
irregularidades na
gestão do Fundo
Amazônia. Estamos
falando de um dos
mecanismos
financeiros mais
controlados e
auditados do país:
duas auditorias
anuais específicas
independentes (financeira
e de compliance); reunião
anual com doadores
que periodicamente
realizam avaliações
independentes –
recentemente
a Noruega e o KFW fizeram avaliações
com resultados
positivos sobre o
Fundo; obrigações de
transparência – com
site específico e
elaboração
de ‘reportes’; além
dos controles usuais
a que o BNDES está
submetido (auditoria
interna, ouvidoria,
CGU e TCU). Em 2018,
o TCU realizou
auditoria sobre
projetos do
Fundo Amazônia com
visitas in loco, com
conclusões positivas
sobre a gestão e a
efetividade dos
projetos apoiados (TC
018.242/2017-0).
Nenhuma das
auditorias ou
avaliações indicou
qualquer tipo de
irregularidades na
gestão do Fundo",
escreveu a
Associação. "Resumo
da história: o BNDES
destitui uma
empregada exemplar
de suas funções
em razão de um blefe
do ministro do Meio
Ambiente",
complementou a AF.
Como tem sido
divulgado para a
opinião pública pela
imprensa,
contrariando a fala
do ministro Ricardo
Salles, o Fundo
Amazônia vem
financiando, nos
últimos dez anos,
projetos de pesquisa
e geração de emprego
e renda com o
compromisso de
incluir socialmente
e não destruir o
meio ambiente. "São
103 ações
diferentes, todas
fiscalizadas e
auditadas pelos
principais doadores:
a Noruega já
repassou mais de R$
3 bilhões; a
Alemanha, R$ 192
milhões; e a
Petrobras, R$ 17
milhões", informou o
jornalista André
Trigueiro no Jornal
Nacional. Segundo
ele, a Embaixada da
Alemanha informou
que está disposta a
ouvir as propostas
do governo
brasileiro, mas
ainda não concorda
com mudanças na
gestão do fundo. Em
nota, a Embaixada da
Noruega declarou
"estar satisfeita
com a robusta
estrutura de
governança do Fundo
Amazônia e com os
resultados obtidos
nos últimos dez anos
e que não recebeu
nenhuma proposta das
autoridades
brasileiras para
mudar a estrutura e
os critérios de
aplicação" hoje
existentes.
Em defesa do Fundo
Amazônia – Na
abertura da
manifestação de
segunda-feira, o
vice-presidente da
AFBNDES, Arthur Koblitz, saudou a
presença dos
empregados no ato de
desagravo "a uma
colega querida e
muito respeitada,
que está passando
por uma situação que
nós não estamos
acostumados". Para
ele, é grave o que
está acontecendo: "É
o sinal dos tempos,
do momento que nós
estamos vivendo no
país e, em
particular, no
BNDES", destacou.
"Nós estamos aqui
para responder a
esta agressão. Quem
acha que a gente vai
compactuar com isto
está redondamente
enganado.
Infelizmente, a nota
divulgada pelo Banco
para explicar o
inexplicável obriga
os benedenses a
estar aqui e a
protestar contra
este arbítrio. Nosso
propósito é defender
a recondução da
colega ao cargo de
onde ela nunca
deveria ter saído, e
com pedido
desculpas. E que a
gente possa
aproveitar este
momento para fazer
uma grande defesa do
Fundo Amazônia e de
sua gestão – uma
tarefa que o BNDES
tomou para si e a
tem exercido com
excelência, com
reconhecimento no
Brasil e no
exterior. E como a
gente tem visto pela
cobertura da
imprensa, a opinião
pública ficará ao
nosso lado",
concluiu.
O 2º vice-presidente
da Associação,
William Saab, disse
que o afastamento da
chefe de
departamento tinha
mais de uma
dimensão: "É uma
demissão construída
com base no nada, no
arrepio do artigo 5º
da Constituição
Federal e da
liberdade
profissional. Uma
das características
de qualquer ato
administrativo é a
sua motivação. E não
há nenhuma motivação
plausível que possa
justificar a
destituição que foi
feita". Em outra
dimensão, William
destacou que também
está sendo
destituído "o
exercício legítimo
de autoridade dos
superintendentes da
casa, e isto é
inadmissível". Para
ele, este fato
precisa ser tratado
de forma coletiva
pelo corpo de
superintendentes: "É
papel do
superintendente
nomear sua equipe de
confiança. No caso
em questão, esse
exercício foi
completamente
usurpado. E isso é
muito grave".
Segundo o dirigente
da AF, "nesse
momento o que está
sendo destituído, em
última instância, é
o próprio BNDES na
sua função de
legítimo gestor do
Fundo Amazônia, como
previsto em lei".
"Quando a gente ouve
vozes que estão se
contrapondo ao que
está ocorrendo, de
representações
internacionais e da
própria imprensa, a
gente verifica que
alguma coisa de
muito errado há",
complementou.
Em nome da AFBNDES
também falou o
diretor de assuntos
institucionais Celso
Evaristo Silva:
"Toda instituição,
assim como todo o
país, tem sua
soberania. Quando
essa soberania é
atingida, esse país
ou essa instituição
perde a sua razão de
ser. Ela se
enfraquece e é mais
fácil de ser
destruída. Qual é o
grande elemento da
soberania de um
país? É a sua
cultura, o seu povo,
suas tradições. E
qual a grande
cultura do BNDES? É
a excelência técnica
do seu corpo
funcional e a
retidão ética
daqueles que aqui
trabalham, e a
Daniela é uma figura
exemplar nesse
sentido". Para
Celso, a instituição
é enfraquecida
quando está no alvo
o que ela tem de
mais sagrado: o seu
corpo técnico.
"Quando querem
atingir uma
instituição, eles
começam exatamente
por aí: destruindo o
moral das pessoas
que nela trabalham,
tornando essas
pessoas inseguras,
com medo de atuar,
afetando sua
soberania". Para
ele, é preciso
resistir à tentativa
de desmonte do
Banco, "como, aliás,
faz parte da
estratégia do
governo em relação a
todas as empresas
estatais". "Não
podemos deixar que
joguem nossa moral e
a nossa ética na
lata do lixo, não
podemos naturalizar
isto. É inadmissível
que em nome de uma
medida
administrativa a
gente atinja o moral
e a moral das
pessoas, a motivação
e a ética dos que
aqui trabalham",
encerrou.
Mais de uma dezena
de outros empregados
fizeram o uso da
palavra de forma
brilhante durante o
ato, protestando
contra a ingerência
do MMA nos assuntos
internos do BNDES,
contra o
comportamento do
ministro do Meio
Ambiente em suas
visitas à casa e
contra a postura da
diretoria do Banco
no caso. Os
empregados também
defenderam o
trabalho
profissional de
Daniela Baccas à
frente da chefia do
Departamento de Meio
Ambiente, o Fundo
Amazônia, seu
compromisso com a
inclusão social, sua
gestão qualificada
pelo BNDES e a
necessária
independência dos
técnicos benedenses
na condução de seu
trabalho, que é
feito com absoluto
rigor técnico. O
ponto alto da
manifestação foi a
moção, aprovada por
unanimidade,
exortando os colegas
para que não aceitem
convite para o cargo
ocupado por Daniela
até a semana
passada. Foi bom de
ver.